O Santander Brasil vendeu, em 2011, um volume de carteiras de crédito podre sem precedentes para o mercado brasileiro. Dívidas vencidas há pelo menos 360 dias de pessoas físicas e empresas num total de R$ 16 bilhões terão sido levadas a leilão pelo braço brasileiro do banco espanhol quando o ano acabar.
A cifra de 2011 equivale a quatro vezes os R$ 4,2 bilhões vendidos em 2010, enquanto, em 2009, a instituição levou a leilão R$ 2,8 bilhões. O valor deste ano é próximo a 9% do total de ativos de crédito que constavam do balanço do banco do terceiro trimestre.
O Santander é o único entre os grandes bancos do país que costuma levar suas carteiras de créditos podres a leilão para recuperar um valor ínfimo do que a inadimplência dos clientes levou embora. As carteiras vendidas nesses leilões, do qual participam como compradores fundos e bancos principalmente estrangeiros em busca de ativos de alto risco, são constituídas de operações de crédito já lançadas como perda, de acordo comas regras do Banco Central (classificados como risco “h”). Ou seja, os ativos já foram removidos do balanço. Portanto, a receita dos leilões, nos quais as carteiras são negociadas com deságio de pelo menos 85%, representa receita na veia para o vendedor.
Os bancos não costumam revelar quanto têm de créditos podres, mas pode-se supor que Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco e Caixa, que são ainda maiores, carreguem volumes mais impressionantes.
O Santander não explica o motivo para ter ampliado a venda de carteiras vencidas, mas é sabido que o banco tem buscado desfazer-se de ativos para levantar recursos em várias de suas filiais para fortalecer a matriz, na Espanha, que terá de atender a novos requerimentos de capital em breve.
Um participante dos leilões do Santander fez uma estimativa que considera conservadora de que o banco pode ter obtido, em média, 2% do valor de face dos créditos vendidos, o que daria uma receita da ordem de R$ 300 milhões.
Segundo informações de mercado, atualmente o Santander tem três vendas de carteira em andamento. O banco informa que em dezembro venderá carteiras com valor de face total de R$ 5 bilhões (incluídos no cálculo de R$ 16 bilhões). Para 2012, o banco carregará ainda R$ 9 bilhões de operações que planeja “passar para frente”.
O negócio de venda de empréstimos não performados (NPL, na sigla em inglês) ganhou tal dimensão no Santander que a instituição vai criar uma securitizadora própria, a exemplo da Ativo S.A., do Banco do Brasil. A intenção é começar a operar sob a nova estrutura entre o terceiro e quarto trimestres do ano que vem.
De acordo com Luciane Petrangelo, gerente de gestão de prejuízo e venda de carteira, os créditos negociados ao longo de 2011 eram, em sua maioria, dívidas de pessoa física, como empréstimo pessoal, operações de financiamento ao consumo. Antes da integração dos sistemas do Real e do Santander, concretizada em fevereiro, a venda das carteiras dos dois bancos era feita de forma separada, mas desde então não é mais possível determinar em qual das duas casas o empréstimo foi originado, informa.
Uma única venda realizada este ano, com uma carteira de valor de face de R$ 4 bilhões, era referente a dívidas de cerca de 1 milhão de CPFs. “Só não cogitamos a venda de crédito imobiliário, de leasing e agrícola”, diz Luciane. A venda de cada tipo de carteira rende um valor diferente ao banco, varia caso a caso, mas ela não revela.
De acordo com estimativas da KPMG, considerando-se carteiras vencidas entre dois e três anos, o valor pago pelo investidor que compra ativos de crédito ao consumidor (CDC) oscila entre 1% e 5% do valor de face (original do crédito), enquanto o intervalo para crédito corporativo vai de 3% a 10% e para cartão de crédito pode ficar entre 2% e 6%. Os melhores preços são pagos em créditos com garantia, como financiamento de veículos, em que o deságio pode ser de apenas 85% para os melhores riscos. Um investidor que participou de leilões do Santander diz que os deságios foram superiores a esses, na média.
Marcelo Malanga, diretor de negócios de recuperação do Santander, diz que o banco é criterioso na hora de selecionar os compradores das dívidas, e também quanto às práticas de cobranças exercidas. “É importante qualificar o investidor, porque é ele quem vai lidar com o nosso cliente, que vai cobrá-lo. Nós não vendemos o cliente, vendemos o contrato”, disse Malanga a diversos investidores em evento promovido nesta semana pela KPMG, em São Paulo. “Se o preço estiver longe da curva que projetamos como interessante, cancelamos a venda.”
De acordo com um grande investidor, os preços subiram neste ano, com o interesse de novos compradores atraídos pelos bons índices de recuperação de créditos.