ARTIGO: O sistema financeiro e a configura‡Æo do PAC

Por Vagner Freitas*

 

Introdução

O início do segundo Governo Lula apresenta uma agenda positiva e com boas perspectivas de êxito e dependerá em muito da capacidade do presidente de articular apoios e comprometimentos com o Programa de Aceleração do Crescimento.

 

Os problemas de toda ordem do país são grandes e exigem soluções urgentes. E essas soluções passam pela retomada sustentada do crescimento econômico no médio e longo prazo. Não pode ser algo de pontual, à mercê das “forças” do mercado, cujo cálculo é sempre imediato.

 

O que se espera de um governo democrático e popular no contexto da sociedade brasileira é que ele mobilize o conjunto da sociedade em torno de Projeto que não se restrinja ao crescimento econômico stricto sensu – mas sim em torno dum conceito de desenvolvimento econômico e social que possua apoio popular e efetividade histórica. O PAC pode ser o ponto de partida. Há praticamente um quarto de século que a economia e a sociedade brasileira patinam. Perdeu-se o rumo do crescimento!

 

 

Características do PAC

O PAC foi arquitetado considerando o cenário de médio prazo:

            

CENÁRIO DO PAC

2007

2008

2009

2010

Taxa SELIC nominal

12,2%

11,4%

10,5%

10,1%

Taxa de Inflação

4,1%

4,5%

4,5%

4,5%

Taxa de Crescimento Real do PIB

4,5%

5,0%

5,0%

5,0%

Resultado Primário em % do PIB

4,3%

4,3%

4,3%

4,3%

PPI em % do PIB

0,5%

0,5%

0,5%

0,5%

Resultado Nominal em % do PIB

-1,9%

-1,2%

-0,6%

-0,2%

  

O propósito é que o crescimento acelerado seja um forte indutor do investimento público e privado. Dada a distribuição territorial dos investimentos públicos espera-se que possam provocar forte efeito multiplicador nas atividades econômicas regionais.

 

Os fundamentos econômicos do PAC estarão ancorados em políticas monetária e cambial cujos instrumentos, espera-se, tenham impacto, de maneira virtuosa, no crédito, nos juros e no câmbio. Tais instrumentos estão focados na demanda efetiva. Busca-se estimular a demanda interna e externa.

 

O PAC tem como fundamentos econômicos:

§         Estabilidade econômica.

§         Responsabilidade fiscal.

§         Baixa vulnerabilidade externa.

 

O gráfico a seguir apresenta a arquitetura dos fundamentos econômicos do PAC:

 

 

Fonte: Governo Federal

 

 

Os programas de investimentos do PAC apontam para cinco áreas:

1.      Investimento em infra-estrutura;

2.      Estímulo ao crédito e financiamento;

3.      Melhora do ambiente de investimento;

4.      Desoneração fiscal e reestruturação do sistema tributário – objetivando sua melhoria;

5.      Medidas fiscais de longo prazo. 

 

 

O sistema financeiro e o PAC

Na formatação do PAC o sistema financeiro está “ausente”, com exceção da linha de crédito aberta à CEF para investimentos em saneamento básico e habitação popular.

 

O documento de apresentação do PAC aponta o estimulo ao crédito e ao financiamento; considerando que o desenvolvimento do mercado de crédito é fundamental para o desenvolvimento econômico e social. Lembra também que em anos recentes o governo já adotara uma serie de medidas que resultaram na expansão do volume de crédito e do mercado de capitais.

O gráfico seguinte mostra o expansão do volume de operações de crédito bancário:

 


                 
Fonte: Governo Federal

 

O que se depreende da intenção do estímulo ao crédito e ao financiamento é que estes acelerem o crescimento a partir do crédito habitacional e do crédito de longo prazo para investimento em infra-estrutura. Trata-se de estratégia clássica no estímulo ao crescimento, dadas as características de maturação dos investimentos.

 

A seguir temos o gráfico que mostra a composição do crédito expresso em porcentual do PIB:

                  

 

 

Todavia o programa traz um desafio político ao próprio Governo: como “induzir” o setor bancário privado a dar sustentação aos investimentos de longo prazo. É sabido que as projeções de retornos nem sempre se realizam, aumento desta feita o chamado custo de oportunidade; há sempre o risco do investimento.

Induzir os bancos privados – e não somente o setor público – a financiarem os investimentos (infra-estrutura) de longo prazo. O governo também deve investir em “infra-estrutura” humana: educação, saúde, segurança, etc.

 

Quanto ao investimento habitacional, informações de imprensa já aventam e existência boom imobiliário. Cresce a valorização de áreas urbanas com a construção de imóveis de alto padrão, mas uma preocupação já se coloca: Se a alocação dos investimentos neste setor não contemplarem efetivamente a construção de moradias, corre-se o risco de termos mais uma “onda” de investimento imobiliário que assume a forma de bolha especulativa. Quando estoura, deixa em seu rastro uma crise no setor!

 

O gráfico a seguir mostra a evolução (composição) do crédito bancário.

 


Fonte: Governo Federal

 

Constata-se a ausência, no PAC, de mecanismos que indicam de maneira explícita a participação do sistema financeiro, sem os quais dificilmente os bancos financiarão os investimentos na perspectiva do desenvolvimento. Ater-se-ão às oportunidades de negócios.

 

Analisando os fundamentos econômicos do PAC fica-se com a impressão de que o “papel” reservado aos bancos quanto ao financiamento do investimento privado ficará sempre à mercê da condução da política monetária.

 

Espera-se que o sistema financeiro se mova a partir da atratividade dos negócios… Aqui vemos mais um desafio para o governo e mais ainda para o movimento sindical bancário: é propor alternativas à sociedade para resgatar as atividades bancárias como concessão pública como preceitua o artigo 192 da Constituição Federal: “o sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulamentado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram”.

 

Para que aconteça o desenvolvimento equilibrado que preceitua o texto constitucional faz-se necessário romper a “dinâmica rentista” que move o sistema financeiro nacional. Persistindo essa prática os demais agentes econômicos estarão sempre à mercê do poder de mercado dos bancos.

 

Vemos ano após ano prosseguir a concentração bancária; cuja decorrência para os trabalhadores bancários é o encolhimento do mercado de trabalho. E, para a clientela, o efeito da falta de concorrência é que os serviços bancários tendem a tornar-se inacessíveis aos segmentos de menor renda na sociedade brasileira.

 

Em tempos em que se fala em inclusão, os bancos atuam na contramão da história: movem-se por uma lógica de exclusão de trabalhadores e correntistas de menor rendas!

 

Haja vista que é o segmento do Capital que detém o maior poder econômico e político na sociedade brasileira contemporânea.

 

A concentração bancária leva à configuração de um mercado oligopolista e não serão “as forças do mercado” que irão baixar o custo do dinheiro para investimento. Corre-se o risco de persistirem os elevados spreads bancarios, a despeito de significativas reduções da taxa Selic e outras medidas que favorecem o setor, principalmente aquelas associadas ao conceito de segurança jurídica.

Na perspectiva de um governo democrático e popular é necessário contrabalançar o poderio do setor bancário, ou seja, romper também a dominância financeira na condução da política econômica. Essa dominância já ocorre num espaço de duas décadas. A partir da CF-1988, no Brasil, tivemos a evolução do setor bancário para a configuração de um sistema financeiro com forte interdependência internacional.

 

O mesmo não aconteceu em outros setores da economia brasileira. A configuração da pauta de exportação dos anos recente nos mostra isso. Os produtos com elevado valor agregado cedem espaço para as commodities. Alguns observadores falam em desindustrialização.

Aqui chegamos a um outro ponto que diz respeito ao sistema financeiro. Trata-se da melhoria do ambiente do investimento. O documento do PAC apontam como melhorias:

 Fonte: Governo Federal

 

Na melhoria do ambiente de investimento o PAC “esquece” dos bancos de fomentos regionais – especialmente o BNB e BASA. Entendemos que estes bancos têm muito a contribuir para o desenvolvimento regional.

 

Aqui também o movimento sindical e demais segmentos da sociedade são desafiados a lutarem para que seja explicitada a agenda do desenvolvimento regional.

 

De sua parte, mais uma vez a "grande mídia" tenta pautar a opinião publica e deixar o governo numa saia justa. Dissemina-se a noção de que o Ministério do Meio Ambiente e o IBAMA “travam” a implantação do PAC…

 

Conclusão

Entendemos que a execução do PAC coloca para o Governo o desafio da sustentabilidade política e econômica do mesmo.

 

Sustentabilidade política no que diz respeito ao cálculo dos capitalistas que não apóiam ideologicamente um governo democrático e popular. A “grande mídia” já veicula “informações” apontando que o PAC não saiu do papel. Como sempre apressada em “julgar” o governo, “esquece” que o horizonte de execução do PAC são quatro anos – até 2010.

 

Sustentabilidade econômica: o governo terá de calibrar e alocar os investimentos públicos de tal modo a buscar que o efeito multiplicar pulverize seus efeitos sobre o conjunto da economia (cadeias produtivas); caso contrário o investimento público continuará sua senda histórica de alavancar a acumulação privada do grande capital.

 

Entendemos como necessário e importante na perspectiva da sustenbilidade do PAC que o governo adote política de ampliação do direcionamento do crédito.

 

Quando olhamos para os indicadores conjunturais da economia brasileira, eles demonstram a correção da CUT e demais Centrais em proporem a Jornada pelo desenvolvimento com distribuição de renda e valorização do trabalho, que efetivamente é a agenda econômica e social dos trabalhadores brasileiros.

 

* Vagner Freitas é presidente da Contraf-CUT e diretor executivo da CUT

                  

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