Crédito cresce menos e fica mais caro em abril, aponta Valor Econômico

Felipe Marques
Valor Econômico – São Paulo

A queda na demanda tanto das famílias como das empresas fez com que o crédito crescesse em abril na menor velocidade desde o começo da série do Banco Central (BC), em março de 2007. O estoque de operações encerrou o mês passado em R$ 2,77 trilhões, com avanço de 13,4% no acumulado de 12 meses.

É um ritmo menor até do que o visto na crise financeira em 2009, quando chegou a avançar 14,6% em novembro. Mesmo o financiamento habitacional e o consignado, que sustentam o avanço do crédito, flagraram a falta de procura e fecharam abril com importante desaceleração. Os spreads, por outro lado, cresceram, em especial na pessoa física.

O crédito imobiliário avançou, no acumulado 12 meses encerrados em abril 30,67%, a maior taxa entre todas as modalidades. No começo do ano, porém, o ritmo maior, de 33,05%. Em abril de 2013, a velocidade era de 34,52% ao ano. Os empréstimos consignados para servidores públicos seguiram na mesma linha. Em abril, cresceram 15,37%, depois de avançar 17,59% em janeiro e 18,81% um ano antes.

“O consignado vai continuar crescendo neste ano, mas mesmo esse avanço tem limite”, afirma o diretor de empréstimos e financiamentos do Banco do Brasil (BB), Edmar Casalatina. “Havia uma demanda represada por bens duráveis no país que já foi atendida e que tinha impacto na procura por consignado. Agora essa demanda vai se normalizar”, afirma o executivo. O mesmo fenômeno explica por que as demais modalidades de crédito pessoa física, como financiamento de veículos e parcelado sem juros no cartão, tiveram desempenhos fracos em abril.

Para Casalatina, o “repasse técnico” da alta da taxa básica de juros para o crédito foi feito em quase todas as modalidades, sendo o consignado uma das exceções. Na média, as taxas de juros das operações de crédito subiram 2,6 pontos percentuais em 12 meses, para 21,1%, embora tenham ficado estáveis na margem.

Para economistas, o desempenho dos empréstimos nos quatro primeiros meses do ano põe em xeque a projeção do BC de avanço de 13% do estoque em 2014. “O movimento de abril surpreendeu negativamente, em especial nos recursos livres. Estávamos esperando que esses empréstimos crescessem um pouco, e não aconteceu”, diz Mariana Oliveira, economista da Tendências Consultoria. Para o fim do ano, a casa projeta um avanço de 12,1% no estoque.

Na visão de Mariana, o avanço da taxa básica de juros nos últimos 12 meses deixou o crédito mais caro, ao passo que os prazos das operações passaram a crescer menos. “Se as condições de crédito estão piores, a demanda fica pior também”, diz.

Se os volumes de crédito desapontam, abril trouxe boas notícias para os bancos no aumento dos spreads das operações de crédito. Em abril, os spreads das operações de crédito subiram 20 pontos base na comparação mensal, sendo que nas linhas de pessoa física, o avanço foi de 30 pontos base. Mais impressionante ainda, se dentro da pessoa física considerarmos apenas os recursos livres (excluindo, portanto, o crédito imobiliário), o avanço dos spreads foi de 60 pontos base no mês.

“Acreditamos que a tendência de spreads mais altos para o crédito deve ser um importante propulsor dos ganhos para bancos brasileiros”, afirma o Credit Suisse, em relatório. Para os analistas do banco suíço, o avanço dos spreads vai continuar em 2014 e pode seguir também em 2015.

Para o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, a estabilidade nos índices de endividamento das famílias sugere que a demanda por crédito não tem espaço para aumentar nos próximos meses. Em relatório, o economista afirmou que “taxas de crescimento anuais na casa dos 13% não parecem ser sustentáveis até o fim de 2014.”

Há até quem considere rever as projeções de crédito para o ano depois do resultado dos primeiros meses. É o caso da LCA, que trabalha com a perspectiva de que o saldo de empréstimos avance 13,5% neste ano. “Hoje o viés é de baixa. O crédito imobiliário começa a sinalizar perda de fôlego, que em parte é compensada pelo crédito rural”, afirma Wermeson França, economista da casa. Na visão dele, as manifestações ocorrendo graças à Copa do Mundo derrubam a confiança dos agentes na economia. “Passada a Copa, esse ambiente pode melhorar.”

A Boa Vista Serviços, que administra cadastro de devedores com nome sujo, também considera revisar a estimativa de 13% de avanço no crédito para 2014. “Houve uma diminuição do crescimento do crédito menor do que a esperada, mas os fundamentos se mantiveram”, afirma Flávio Calife, economista da instituição. “Se há menor disposição para consumir, há menor demanda por crédito. O lado positivo é que a qualidade do crédito está estável”, afirma.

“Enquanto sustentáculo do consumo, o crédito não deverá prover grandes ajudas adicionais ao longo deste ano”, afirma a Rosenberg Consultores Associados, em relatório assinado pela economista Thais Zara. “A tendência para a inadimplência é ainda benéfica, mas esta continua sendo a única boa notícia”, escreve, apontando o desempenho fraco do setor de serviços neste ano e a falta de dinamismo do mercado de trabalho como as causas do crédito mais fraco.

“Havia uma expectativa de que o segundo trimestre fosse um dos melhores do ano, o que não aconteceu a julgar pelo crédito”, afirma Nicola Tingas, economista da associação que reúne as financeiras (Acrefi). Assim como a LCA, ele espera que no segundo semestre, passada a Copa e com uma definição mais clara sobre a eleição, exista uma possibilidade de avanço maior do crédito.

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