Valor Econômico
Vanessa Adachi, de São Paulo
Colaborou Fernando Travaglini
Os bancos Credit Suisse e Santander lançaram ontem uma oferta pública de um fundo com características inovadoras para investir em créditos concedidos a empresas. Com perspectiva de atingir um patrimônio expressivo de quase R$ 2,9 bilhões, o fundo será um instrumento poderoso para conceder empréstimos para grandes empresas brasileiras, com risco fora do balanço dos bancos envolvidos.
De outro lado, investidores institucionais brasileiros têm se mostrado ávidos por ativos alternativos, que lhes permitam remunerações diferenciadas, em face da cadente taxa de juro paga pelos títulos públicos, até hoje o instrumento de investimento mais demandado.
Juridicamente, trata-se de um Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC). Mas, até agora, quase tudo o que vinha sendo feito no mercado com esse instrumento servia para que instituições financeiras médias concedessem crédito para empresas também de porte pequeno ou médio. Agora, o jogo ganhou outra dimensão.
O fundo, batizado de Crédito Corporativo Brasil, é estruturado por grandes bancos e servirá para dar crédito de longo prazo a grandes corporações nacionais. Os créditos contratados poderão ter prazo de até seis anos, que coincide com o prazo de duração do fundo. Os FIDCs tradicionais costumam ter prazo de um a três anos.
Se atingir a captação desejada pelos bancos, esse fundo sozinho equivalerá ao patrimônio de todos os demais FIDCs distribuídos via oferta pública neste ano até agora.
O fundo poderá comprar diversos tipos de títulos privados: debêntures, notas promissórias, cédulas de crédito bancário (CCB), cédulas de crédito imobiliário (CCI), notas de crédito à exportação (NCE), entre outros. Não serão comprados títulos já existentes. O objetivo é usar os recursos captados para originar crédito novo.
Uma mesma empresa poderá receber empréstimo de até R$ 350 milhões. O mínimo por papel comprado será de R$ 50 milhões. Credit Suisse e Santander integrarão o comitê de crédito do fundo, que decidirá onde o dinheiro será aplicado. Investidores também indicarão membros para o comitê. O investimento mínimo no fundo é de R$ 1 milhão e o retorno alvo é estimado em CDI mais 1,5% ao ano, atualmente equivalente a 10,25% ao ano (8,75% do juro básico mais 1,5%).
Os aplicadores poderão comprar quotas sênior ou subordinadas. Ao todo, o fundo poderá vender até 28,8 mil quotas, sendo 24 mil das sêniores e 4,8 mil das subordinadas.
A Standard & Poor’s atribuiu rating preliminar às quotas e também será responsável por avaliar o risco de crédito de cada papel comprado. As quotas sênior tiveram nota “brAAf”, que embute uma avaliação de proteção “muito forte” para os investidores.
As subordinadas foram avaliadas como “brBBf”, uma proteção “incerta”.
“Esse é um produto para uma demanda de crédito que nem sempre os bancos têm balanço para atender”, comenta Jean-Pierre Cote Gil, diretor da S&P responsável pelo relatório de análise. “Poucas empresas no país têm acesso a crédito de grande volume por prazo tão longo. Resta agora conhecer a demanda do investidor.”
Cote Gil explicou que os quotistas sêniores terão garantias muito fortes, já que eventuais perdas serão absorvidas pelas quotas subordinadas, que corresponderão a 16,6% do total captado. O relatório da S&P aponta que, levando-se em conta os vários limites de aplicação do fundo, poderá haver apenas 12 devedores diferentes no cenário de maior concentração. “Entretanto, é provável que o FIDC apresente maior diversificação”, diz o texto.
Ao longo de seus seis anos de duração, o fundo poderá girar a carteira, comprando títulos mais curtos, ou adquirir papéis com prazo igual ao seu vencimento.
O gestor do fundo será o Credit Suisse e o Santander fará a custódia dos títulos, verificando a adequação deles à política de investimento. A administração caberá à Caixa Econômica Federal. Os bancos não comentaram a oferta por causa do período de silêncio.
Se a ideia for bem sucedida – e tem ingredientes muito favoráveis para isso – é bastante provável que outras instituições façam o mesmo. Muitas gestoras de recursos têm demonstrado interesse em montar fundos de crédito privado.
A Vinci Partners, do ex-banqueiro Gilberto Sayão, por exemplo, já trabalha na estruturação de um fundo de crédito privado. A Mauá Sekular, fruto da fusão das gestoras Mauá e Sekular, também informou recentemente que um dos seus grandes interesses está em créditos privados.
Há duas semanas, no congresso dos fundos de pensão, em Curitiba, o discurso dos fundos de pensão era um só: como buscar alternativas de investimento aos títulos públicos. A taxa de retorno dos Certificados de Depósito Bancários (CDB) também vem perdendo atratividade. As seguradoras, que sempre garantiram o lucro com ganhos financeiros, também sofrem agora com a queda do juro.