Começa nesta nesta terça-feira (17) o 2º Congresso da Confederação Sindical dos Trabalhadores das Américas (CSA), em Foz do Iguaçu, no Paraná, com o tema “Desenvolvimento Sustentável, Democracia e Trabalho Decente: Construindo uma nova sociedade”. Os organizadores esperam reunir cerca de 500 representantes de organizações filiadas e fraternas, observadores e convidados de todo o mundo.
Nesta entrevista ao site da CUT, o secretário de Relações Internacionais da CUT, professor João Antonio Felicio faz uma avaliação sobre o protagonismo desempenhado pela CSA na condução das lutas da classe trabalhadora e na construção de alternativas à crise em que se vêem mergulhadas as economias dos países capitalistas centrais.
Qual a sua avaliação do atual momento da CSA?
Nós cutistas temos uma avaliação muito positiva do trabalho que vem sendo desenvolvido pela direção da CSA. É uma prática sindical que nos orgulha, centrada no campo da esquerda e que avança no sentido de unificar as lutas da classe trabalhadora, de Norte a Sul do Continente, procurando estabelecer relações solidárias entre as centrais maiores e menores.
Em que pesem todas as inúmeras dificuldades, perseguições e, inclusive, assassinatos, como acontece no caso colombiano, nossa Confederação tem se norteado pela luta, pela construção de um sindicalismo democrático e de base. Acredito que esta é a melhor fase da organização sindical das Américas.
Fase que também dialoga com a existência de uma série de governos democráticos e populares…
Reconhecemos que há contradições, mas quem conhece a história latino-americana sabe que tivemos muitas ditaduras militares e que é muito mais estimulante praticar o sindicalismo na atualidade do que quando éramos perseguidos. Acredito que a CSA tem conseguido aproveitar a existência de vários governos democrático-populares, exercitado sua capacidade de diálogo, de organização e mobilização, com uma política de frente ampla.
Somando diferentes contribuições e variadas concepções, fomos consolidando nossas entidades e abrindo caminho para esta nova situação, bem melhor do que as anteriores. A verdadeira democracia que a CSA quer construir dialoga com a distribuição de renda, com a consolidação de direitos.
Esta pressão também abre espaço para novos avanços…
A consolidação desses governos progressistas tem fortalecido o movimento sindical, ampliado o seu poder de pressão, virando a página de governos que se batiam pela redução de direitos, pela imposição, pela negativa ao diálogo social. Precisamos avançar e consolidar a unidade latino-americana, através de instrumentos como o Mercosul e a Unasul, que necessariamente devem ir muito além das transações comerciais, que devem servir para ampliar direitos. Este é o sentido integracionista que precisa ser abraçado pelos governos, para que se traduza na melhoria concreta das condições de vida e trabalho.
Exatamente o oposto da desintegração que vem sendo praticada na Europa.
Qualquer análise de conjuntura reconhece que a democracia na Europa está involuindo, com sucessivos governos sendo impostos pelo sistema financeiro, completamente à revelia do povo. Assim como no pós-guerra tivemos um marco positivo, sendo o período da história onde houve maior consolidação de direitos sociais, hoje há um marco negativo, de enorme retrocesso na concentração de renda, em que uma ínfima minoria, que já era milionária, tem aumentado ainda mais o seu poder.
É inaceitável que os mesquinhos interesses de 1% se sobreponham aos demais 99% da sociedade. Esta mensagem de concentração e exclusão é apropriada pelos neoliberais tupiniquins, que passam a defender a bandeira das reformas neoliberais como um retrocesso, para abrir caminho às privatizações, ao arrocho salarial e à precarização de direitos. Nós lutamos para que os governos ergam barreiras a estas pretensões alimentadas pelo capital financeiro internacional e pelas transnacionais para impor a marcha à ré, colocando os governos numa espécie de camisa de força recessiva.
Na luta política em curso, a CUT tem defendido um maior investimento das entidades na formação, em municiar ideologicamente as lideranças para a batalha. Como é isso?
Temos a compreensão de que é preciso ir além da mera reivindicação trabalhista, de que é necessário investir na formação dos dirigentes sindicais para que tenham a visão mais ampla possível da luta de classes em curso. O capitalismo tende a mascarar este embate, a vender como naturais seus dogmas, suas verdades, anestesiando a sua dominação.
Nós lutamos para a superação desta fase de alienação e empobrecimento, de manipulação e apatia, de individualismo atroz, de salve-se quem puder. Nós lutamos para construir uma nova sociedade, coletiva, onde justiça, companheirismo e solidariedade se complementem.
Há uma disputa em curso contra o parasitismo do capital financeiro, que atenta contra a produção, o emprego, o salário, e que cultua a especulação como um deus.
Diante do avanço do poder do sistema financeiro e de práticas que acabam inviabilizando a produção e arrasando as economias dos países, defendemos que sejam tomadas medidas urgentes. A taxação das transações e o controle do sistema financeiro são duas medidas importantes, que dialogam com a defesa da soberania dos países e povos.
O que não podemos mais permitir é que o sistema especulativo continue controlando governos, abolindo a democracia em favor do poder dos bancos e das bolsas de valores. Governos como o da desindustrializada Inglaterra, por exemplo, viraram presa desta lógica excludente e parasitária.
No Brasil, o PIB do ano passado registra expressivo recuo do setor industrial de 16,2% do PIB em 2010 para 14,6%. As vendas do varejo cresceram mais de 7% em 2011, mas a produção industrial avançou somente 0,3%, com a diferença coberta pelas importações. Como combater a desindustrialização?
Entre as excelentes alternativas que temos está aumentar a dinâmica do mercado latino-americano por meio de relações solidárias que aproveitem as ricas potencialidades e complementaridades das nossas economias. Não haverá país rico rodeado de pobreza por todos os lados.
Hoje os países mais ricos do mundo estão inundando o mundo de dólares, rodando a maquininha, numa ação completamente artificial que gera riqueza sem lastro algum, sem qualquer correspondência na realidade. Para se defender, a China vinculou a sua taxa de câmbio ao dólar, oscilando junto com ele.
O Brasil deve enfrentar o problema da desindustrialização, que traz também desnacionalização, com medidas soberanas. Temos a possibilidade de controlar o câmbio, temos a possibilidade de aumentar as tarifas dos importados e de exigir um mínimo de 60% de componentes nacionais, como foi feito recentemente na indústria naval.
Aliás, esta é uma medida que fez um bem danado ao Rio de Janeiro, onde tínhamos quatro mil empregos há dez anos e hoje temos mais de quarenta mil. Isso apenas com o aumento do percentual de nacionalização dos componentes. Temos inúmeros exemplos que deram certo. Empresas que foram sucateadas pelos tucanos e que agora se encontram recuperadas.
O Congresso da CSA vem em boa hora para reforçar algumas bandeiras chaves para o desenvolvimento nacional soberano e sustentável?
Claro que sim. Reitero: a CSA vem tendo uma ação bastante firme em defesa do emprego e do trabalho decente, do aperfeiçoamento da relação com as suas entidades de base. O Congresso será um momento de ampliação desta unidade, com um diagnóstico mais profundo da situação política, econômica e organizativa das centrais.
Acredito que vamos aprovar uma agenda para avançar e dar representativa ainda maior e mais ampla à nossa Confederação. Vamos consolidar a pauta da classe trabalhadora, sempre ameaçada por grupos de direita saudosos do passado. Infelizmente os exemplos que temos até do Canadá e dos Estados Unidos – sem falar no desastre europeu – mostram que as práticas antissindicais foram reforçadas no último período por empresas transnacionais que querem jogar o ônus da crise sob as costas dos trabalhadores, o que só comprimiria ainda mais o mercado de trabalho.
Nós acreditamos que a roda da economia deve girar para frente com mais salário, mais emprego e mais direitos. É assim que o bolo vai crescer, é assim que teremos mais e mais para dividir. Nossa linha é desenvolvimentista. A deles é recessiva. Nós queremos descortinar o futuro. Eles querem trazer de volta o passado.