O debate “Conjuntura Nacional e as Eleições de 2008” reuniu no Auditório da CUT, em São Paulo, dezenas de lideranças da Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), que debateram durante mais de quatro horas ações comuns de enfrentamento ao retrocesso demo-tucano e do fortalecimento do papel do Estado, com a afirmação de políticas sociais e do controle social.
Uma das decisões do encontro é fortalecer a campanha “O Pré-Sal é nosso!”, que vem sendo capitaneada pela Federação Única dos Petroleiros (FUP). As entidades encaminharão ao Congresso Nacional um projeto de lei de iniciativa popular, “nos termos do artigo 61, parágrafo 2º, da Constituição da República, visando a consolidação do monopólio estatal do petróleo, a reestatização da Petrobrás, com o fim das concessões para exploração das jazidas brasileiras de petróleo e gás, e garantindo a destinação social dos recursos gerados por esta atividade”.
Sob a coordenação de Antonio Carlos Spis, da executiva nacional da CUT e da CMS, a mesa foi composta por Gilmar Mauro, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST); Neusa Tito, da Marcha Mundial de Mulheres; Ricardo Gebrim, do Sindicato dos Advogados de São Paulo e da Assembléia Popular e pelo jornalista Altamiro Borges. Entre outros, estiveram presentes dirigentes da UNE, UBES, Movimento dos Trabalhadores Desempregados, Coletivo Intervozes, Assembléia Popular e Via Campesina.
Spis ressaltou o papel fundamental da unidade e da mobilização dos movimentos sociais na derrota da direita, “que vê nas eleições de 2008 a ante-sala de 2010”, e da necessidade da consolidação e avanço do projeto nacional de desenvolvimento com inclusão social, valorização do trabalho e distribuição de renda. O dirigente cutista denunciou a ação articulada de setores conservadores do Judiciário, que tem buscado criminalizar os movimentos sociais e inviabilizar entidades como o MST, e voltou a cobrar do governo federal a democratização dos meios de comunicação, com a liberação de canais públicos para que as entidades populares dialoguem com a população, rompendo o cerco da ditadura midiática.
Recordando a vitoriosa campanha contra a Alca, Neusa Tito defendeu que a CMS amplie o debate sobre as mudanças na política econômica, que ainda mantém o país preso a um receituário que penaliza com mais intensidade as mulheres e crianças. A representante da Marcha Mundial de Mulheres frisou que a luta pelas reformas agrária e urbana precisa cada vez mais ser incorporada como elemento central da atuação das entidades, que precisam lutar por políticas públicas, apostando “no fortalecimento estratégico do Estado como instrumento do desenvolvimento e justiça social”.
De acordo com Altamiro Borges, há três tarefas essenciais que precisam ser assumidas coletivamente pelas entidades: o fortalecimento e intensificação das ações dos movimentos sociais, ocupar e ampliar espaços no terreno institucional e elevar o debate político-ideológico na sociedade. Miro fez uma radiografia precisa sobre a crise do neoliberalismo e a ascensão da luta dos povos, particularmente na América Latina, que foi até pouco tempo o principal laboratório das políticas paridas pelo “Consenso de Washington”. “Hoje, o império do mal está em crise. Se sua força reside no poder das armas, do dinheiro e da palavra, podemos afirmar que os nossos inimigos estão frágeis, com Bush correndo o risco de sair pela porta dos fundos. E se os nossos inimigos estão frágeis, melhor para nós, que não podemos continuar como se ainda estivéssemos moldados pelo Tratado de Tordesilhas em relação à América Latina. Falta um sentimento de pertencimento para que consigamos avançar mais decisivamente”, acrescentou. Segundo Miro, do ponto de vista nacional, é chave afirmar uma agenda positiva comum como a ratificação das Convenções da OIT pelo direito de negociação coletiva dos servidores (151) e contra as demissões imotivadas (158), pela redução da jornada de trabalho, ampliação da licença-maternidade e garantia de direitos das empregadas domésticas. “Estas são algumas das bandeiras que nos unificam e que contribuem para superar a atomização”, sublinhou.
Em nome do MST, Gilmar Mauro denunciou que por trás do aumento dos alimentos está o capital financeiro, que migrou para as commodities da Bolsa de Mercado e Futuros, transformando produtos agrícolas como milho e soja em mercadorias, fazendo da fome um negócio altamente lucrativo. “Assim, a safra de 2015, 2020, já foi comprada e se especula em cima disso. Por isso a luta pela reforma agrária é uma luta anti-sistêmica, de enfrentamento ao agronegócio, às transnacionais e ao capital financeiro. Precisamos cada vez mais casas a luta social e econômica com a luta política”, declarou. Alertando para os riscos do impacto social e ambiental do modelo agroexportador, Gilmar lembrou que desta forma “a agricultura passou a ser mais um espaço de valorização do capital”. O Brasil conta com um diferencial a seu favor, pois possui grandes extensões de terra, água e sol, e não pode ficar restrito, destacou, a ser um grande exportador de comoditties. “Por trás dos produtos agrícolas estamos contaminando nosso solo, nossa água, com uma grande quantidade de agrotóxicos. Estamos exportando água, num mundo que tem 97% de água salgada, 2,3% nas calotas polares que estão degelando e apenas 0,7% nos rios, lençóis freáticos e lagos. A água já é um problema concreto em várias partes do mundo”, ressaltou. Gilmar Mauro denunciou que, infelizmente, “não há política de reforma agrária, mas de negócio agrícola” e sublinhou o papel da CMS para que seja alterada a atual estrutura fundiária brasileira.
Ao elencar várias mobilizações e campanhas unitárias desenvolvidas pelos movimentos sociais, como a luta contra a Alca, pela reestatização da Vale e o “Fora Bush”, Ricardo Gebrim condenou os setores que “reduziram o patamar das reivindicações, numa lógica de se adaptar ao governo Lula”, e também os que “passaram a eleger o governo Lula como alvo principal”. “A CMS manteve a sua autonomia, não rebaixou os seus horizontes e nem deixou se pautar pela oposição. Nossa característica central deve continuar sendo a unidade das forças sociais, a unidade política, para avançar”, declarou Gebrim, para quem a luta pela soberania brasileira no Pré-Sal, com o controle social e a distribuição das riquezas advindas da extração deve ser uma das prioridades da CMS no próximo período.
“A contribuição dos painelistas foi extremamente rica, a que se somou a intensa participação do plenário, apontando para uma unidade de ação do conjunto dos movimentos sociais em todo o país. Esta mobilização precisa ganhar espaço nos meios de comunicação das nossas entidades, a fim de garantir a necessária visibilidade para o confronto e a pressão popular na disputa pela hegemonia”, avaliou Rosane Bertotti, secretária de Comunicação da CUT.
Da direção nacional da CUT, também participaram dos debates o secretário geral, Quintino Severo; o coordenador da Comissão de Meio Ambiente, Temístocles Marcelos Neto e o membro da executiva, Júlio Turra, além de representações cutistas do Distrito Federal, Minas Gerais e Rio de Janeiro.