MPF denuncia coronel Ustra por morte de jornalista na ditadura militar

O Ministério Público Federal denunciou, nesta segunda-feira (22), três militares pela morte do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino (foto), em julho de 1971, auge da ditadura no país. O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, o delegado Dirceu Gravina e o servidor aposentado Aparecio Laertes Calandra são acusados por homicídio doloso qualificado. Além deles, o médico legista Abeylard de Queiroz Orsini, que assinou laudos sobre a morte de Merlino, também foi denunciado por falsidade ideológica.

Além da condenação por homicídio doloso e falsidade ideológica, o MPF quer que Ustra, Gravina, Calandra e Orsini tenham a pena aumentada devido a vários agravantes, como motivo torpe para a morte, emprego de tortura, abuso de poder e prática de um crime para a ocultação e a impunidade de outro.

Os procuradores da República que assinam o documento pedem ainda que os acusados percam cargos públicos que ocupam atualmente e o cancelamento de aposentadoria concedida ou qualquer outra forma de provento que recebam. Solicita ainda que, enquanto tramitar o processo, Gravina seja afastado cautelarmente do cargo de delegado de Polícia Civil, bem como que seja vedado a Orsini o exercício da medicina.

Sem prescrição

A medida faz parte de uma estratégia do MPF de ressuscitar casos do regime militar. Ex-chefe do DOI-Codi, Ustra já foi denunciado sob acusação de ocultar o corpo de um estudante, mas a pena foi considerada prescrita pela Justiça Federal em São Paulo, ainda em primeira instância.

A tese é de que não ocorre prescrição ou anistia no caso. “Os delitos foram cometidos em contexto de ataque sistemático e generalizado à população, em razão da ditadura militar brasileira, com pleno conhecimento desse ataque, o que os qualifica como crimes contra a humanidade – e, portanto, imprescritíveis e impassíveis de anistia”, diz trecho da denúncia.

Os procuradores citam decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, proferida em novembro de 2010, determinando que o Brasil não pode criar obstáculos à punição de crimes contra a humanidade. Além disso, mencionam recente parecer do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, segundo o qual deve ser afastada qualquer interpretação que afirme estarem os delitos contra a humanidade cobertos por anistia ou prescrição.

Entenda o caso

Integrante do Partido Comunista Operário, Merlino foi preso em Santos, em 15 de julho de 1971, e levado ao Destacamento de Operações de Informações do II Exército (DOI), em São Paulo, segundo o MPF. Ele morreu quatro dias depois. Ainda de acordo com a denúncia, ele sofreu sessões de tortura durante 24 horas, para passar informações sobre outros membros do partido, como a companheira do jornalista, Angelas Mendes de Almeida.

Com ferimentos por todo o corpo, o jornalista só teria sido encaminhado ao Hospital do Exército quando já estava inconsciente. De acordo com a denúncia, foi criada uma versão falsa para ocultar as causas da morte: Merlino teria se atirado sob um carro durante uma tentativa de fuga, na BR-116, na altura da cidade de Jacurupinga.

No Instituto Médico Legal, o médico legista Abeylard de Queiroz Orsini teria endossado a versão ao assinar o laudo sobre a morte, em conjunto com outro servidor, Isaac Abramovitch, já morto. Segundo a denúncia, os dois sabiam das circunstâncias em que Merlino foi morto e omitiram as agressões. Na década de 1990, afirma o MPF, peritos revelaram uma série de inconsistências nos laudos sobre Merlino e outros militantes políticos mortos na época, todos subscritos por Orsini.

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