A Petrobras Transporte (Transpetro) foi condenada pela Justiça do Trabalho a substituir, por concursados, empregados contratados por meio de terceirização considerada ilícita e ainda deve pagar indenização por dano moral coletivo de R$ 1 milhão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) negou provimento a agravo da empresa contra a condenação, imposta pelo Tribunal Regional do Trabalho na 19ª Região (AL) em ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho.
A condenação se baseou no artigo 37 da Constituição Federal, que prevê a obrigatoriedade do concurso público, e na Súmula 331 do TST, que trata da terceirização. Deverão ser contratados 43 concursados para substituir os terceirizados em várias áreas da empresa em Alagoas, da administrativa até os serviços de mecânicos especializados. Os cargos ocupados pelos empregados terceirizados têm as mesmas características dos previstos no plano de cargos e salários da Transpetro e foram objeto de concurso público.
O ministro Vieira de Mello Filho, relator do caso, enfatizou que a liberdade de contratar e de exercer atividade econômica – como defendeu a Transpetro em seu recurso – deve observar o respeito à pessoa humana. Segundo o ministro, “não é isso que a terceirização desenfreada tem acarretado”, pois o uso abusivo dessa modalidade de contratação “tem destroçado categorias sindicais, implicado a redução de patamares salariais e de condições asseguradas em normas coletivas para categorias historicamente sólidas e, mais grave, vitimado trabalhadores terceirizados com acidentes de trabalho e doenças profissionais em proporções alarmantes”.
Para o relator, no caso da Transpetro, a questão é ainda mais grave. “Em se tratando de integrante da Administração Pública Indireta, a contratação terceirizada de trabalhadores para desempenho de atividade fim da empresa (portanto, inserida no seu Plano de Cargos e Salários) traduz-se em burla à exigência constitucional do certame público e, no caso, representou a preterição de candidatos aprovados em concurso vigente”.
Ação civil pública
O Ministério Público do Trabalho (MPT), representado pela Procuradoria Regional da 19ª Região (AL), pediu, na ação civil pública, a rescisão de contratos que considerou ilegais e a convocação imediata de aprovados em concurso público. O MPT disse que, durante as investigações, tentou acordo administrativo para a substituição dos terceirizados por concursados, sem sucesso.
O preposto da Transpetro confirmou a existência de cerca de dois mil terceirizados em funções constantes no plano de cargos e salários. Para o MPT, a análise dos contratos e essas informações comprovariam a necessidade de pessoal da Transpetro e, consequentemente, a terceirização ilícita em detrimento dos aprovados.
Terceirização x concurso
O Juízo da Oitava Vara do Trabalho de Maceió concluiu pela ilicitude da terceirização e declarou a invalidade dos contratos. A sentença condenou a Transpetro à imediata contratação dos 43 concursados, sob pena de multa diária de R$ 20 mil, e a substituição dos demais terceirizados pelos aprovados para o cadastro reserva. A empresa também foi condenada a pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 2,5 milhões.
A Transpetro apelou alegando que a sentença teria violado seu poder de gestão ao restringir suas contratações, e a colocou em risco de sofrer ações das contratadas e seus empregados, se tiver de substituir os terceirizados por concursados. Alegou ainda que o MPT não teria legitimidade para propor a ação civil pública, pois estaria defendendo o interesse de um grupo de pessoas (os concursados), e não da coletividade.
O TRT-AL manteve a condenação à imediata contratação dos 43 aprovados, mas excluiu a obrigação de substituição de todos os terceirizados e reduziu a indenização por dano moral coletivo para R$ 1 milhão.
Segundo o Regional, há vedação, com base constitucional, de terceirização das atividades fim da empresa. O TRT concluiu que o princípio da razoabilidade não permite que a empresa empregue seus recursos financeiros no pagamento de terceirizados para atividades que podem ser realizadas pelos integrantes de cadastro reserva, que se submeteram ao concurso público exigido na Constituição.
Dano moral coletivo
A Transpetro tentou trazer o caso à discussão no TST, mas seu agravo foi desprovido pela Sétima Turma. Quanto à ilegitimidade do MPT, o ministro Vieira de Mello Filho registrou que o Supremo Tribunal Federal e o TST “admitem, amplamente, a defesa dos direitos individuais homogêneos pelo Ministério Público do Trabalho em sede de ação civil pública”.
Além disso, lembrou que a questão se refere à garantia constitucional de acesso igualitário aos cargos públicos, que atinge não apenas os aprovados no concurso, mas todos que poderiam participar dele, “sem mencionar o direito dos cidadãos de terem as instituições que operam com o patrimônio público ocupadas por empregados concursados”, afirmou.
O ministro também considerou justificada a condenação por dano moral coletivo, lembrando que, segundo o Regional, a empresa teve gasto em torno de R$ 60 milhões com contratação terceirizada. “Fica evidenciado que o ente da administração pública indireta, para assegurar seu altíssimo patamar de lucros, tem feito da fraude à legislação do trabalho um modus operandi, que comprovadamente marca sua atuação no estado de Alagoas e possivelmente em outros estados da federação”.
Para Vieira de Mello Filho, a reparação por dano moral coletivo “se destina tanto à recomposição da coletividade quanto à produção de efeito pedagógico em relação ao agente infrator, o que, se tratando de economia de mercado, deve representar valor suficiente a desestimular a reiteração da conduta pela demonstração de que o custo judicial da insistência no ilícito seria superior aos ganhos obtidos com o desrespeito ao ordenamento jurídico”.