CUT e CSI cobram da cúpula do G20 taxação e controle do sistema financeiro

O secretário de Relações Internacionais da CUT (Central Única dos Trabalhadores), João Antonio Felício, participou nos dias 3 e 4 de novembro da cúpula do G-20, em Cannes, na França. Integrando a delegação da Confederação Sindical Internacional (CSI), o dirigente cutista somou sua voz a de lideranças da CGT – Argentina; Kosatu – África do Sul; AFL-CIO – EUA; CLC – Canadá, Força Sindical – Brasil, CCOO e UGT – Espanha; DGB – Alemanha, CGT, CFDT e FO – França; TUC – Inglaterra; CISL, CGIL, UIL – Itália; KCT – Coreia e CROC e CTM – México, e da central chinesa.

A representação da CSI esteve reunida com presidentes e dirigentes dos governos da Alemanha, Argentina, Brasil, Canadá, China, Espanha, EUA, França, Inglaterra, México e Rússia, expondo questões apontadas como chaves para o enfrentamento da crise: a taxação sobre transações financeiras e o estabelecimento de um piso de proteção social, contra qualquer reforma que retire direitos e pelo crescimento econômico que crie novos postos de trabalho.

Nesta entrevista, João Felício fala sobre a ação do movimento sindical, a reunião do G-20 e seus desdobramentos.

Qual a sua avaliação sobre o papel desempenhado pelo movimento sindical em Cannes?

Tivemos uma participação coesa, incisiva e bastante significativa. Afirmamos que para enfrentar a crise é preciso por fim à ciranda financeira, fortalecendo o papel do Estado a fim de que exerça seu papel de controle, resguardando o interesse público e não fique refém da chantagem de banqueiros e especuladores.

A crise econômica está se aprofundando diante da forma como muitos governos têm capitulado aos interesses dos bancos. Infelizmente, há governantes que em vez de agirem em sintonia com o interesse de seus povos, tentam jogar o peso da crise que eles próprios criaram sobre as costas dos trabalhadores e da população mais pobre.

Desta forma atuam como agentes do sistema financeiro, apagando o sentido de Pátria e de soberania. Com isso, aumenta o desemprego de longa duração, o desemprego juvenil vai às alturas, os salários dos trabalhadores e os proventos dos aposentados são arrochados, num círculo vicioso de insegurança que começa a provocar uma descrença na própria democracia.

Um exemplo claro é o que está ocorrendo na Grécia, que ficou sob tutela da chamada troika formada pelo FMI, pela Comissão Europeia e pelo Banco Central Europeu, cujas decisões se sobrepõem ao governo do país, numa ditadura dos “mercados financeiros”.

Qual o tamanho da crise?

Apenas com a recessão deste último período, são 80 milhões de pessoas que foram jogadas na pobreza extrema, fazendo com que tenhamos hoje no mundo 1,4 bilhão de pessoas nesta condição lastimável, sobrevivendo com menos de 1,25 dólar por dia.

No entanto, a completa insensibilidade da maioria dos governos da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) está fazendo com que coloquem seus países e povos em função dos interesses do sistema financeiro, com uma política de “ajuste fiscal” e cortes nos investimentos públicos que nós, latino-americanos, sabemos aonde vai dar.

Os bancos centrais destes países atuam hoje em função dos interesses de uma pequena oligarquia que tem parasitado o conjunto da economia. As economias nacionais estão amarradas pela lógica irracional da insolvência financeira, hoje aqueles governos têm comprometido de 20 a 30% do seu PIB com a banca privada.

Há um texto recente de Gérard Filoche e Jean-Jacques Chavigné, “Nada assusta mais os mercados financeiros do que a democracia”, que demonstra exatamente isso.

Está ficando cada dia mais claro não só para economistas e intelectuais, mas para o conjunto da população que esse domínio da União Europeia pelos mercados financeiros se deu por uma capitulação construída politicamente pelos tratados europeus, notadamente por três artigos.

Vou reproduzir textualmente a denúncia dos autores citados; “O artigo 63 instaura a livre circulação de capitais, deixando a UE sem proteção contra a especulação dos capitais do mundo inteiro. O artigo 121 § 1º proíbe ao Banco Central Europeu emprestar aos Estados-membros ou adquirir diretamente títulos da dívida pública desses Estados. O artigo 125 § 1º proíbe à União emprestar a um Estado-membro ou a um Estado-membro de emprestar a outro Estado-membro. Na ausência de qualquer orçamento federal europeu digno desse nome, um Estado, quando necessita tomar emprestado, não tem mais outra solução, senão fazer um apelo aos mercados financeiros”.

Para a CSI, quais as medidas necessárias a serem adotadas neste momento?

Nós reivindicamos dos líderes do G-20 a adoção de quatro pontos para dinamizar o mercado interno, apontando para uma recuperação que não só ponha um freio à crise, mas que seja um caminho socialmente justo, sustentável do ponto de vista econômico e ambiental. Em primeiro lugar, reiteramos a necessidade de implementar rapidamente uma reforma do setor financeiro em que o Estado tenha um papel central no seu controle e que seja adotada uma taxa sobre transações financeiras.

Em segundo lugar, defendemos que o emprego de qualidade esteja no epicentro da recuperação, incluindo a adoção imediata de programas de infraestrutura que requeiram trabalho intensivo e um incremento das qualificações. Um terceiro ponto é a necessidade de transformar a agenda de políticas estruturais para fortalecer as instituições do mercado de trabalho, o diálogo social e a negociação coletiva, garantindo uma lei de salários mínimos e apoio à população de baixa renda para reduzir as desigualdades, com atenção especial para a juventude. E o quarto ponto, mas não menos importante, é o estabelecimento de um piso de proteção social, que seria uma espécie de Bolsa Família, garantindo condições mínimas de sobrevivência a dezenas de milhões de famílias que se encontram totalmente desamparadas.

Qual o tamanho do buraco desta “nova fase perigosa”?

As economias emergentes e em desenvolvimento estão em franca desaceleração. No documento que entregamos aos chefes de governo alertamos que é necessário agir rápido, pois o desemprego mundial já afeta mais de 200 milhões de pessoas, 27 milhões acima do nível anterior à crise. Além disso, a recessão ameaça colocar ainda mais gente entre os que já se encontram jogados na pobreza extrema, com conseqüências econômicas, sociais e políticas devastadoras.

É para fazer frente a esses problemas que amplos setores têm defendido uma auditoria pública das dívidas, seguida de um referendo para decidir que parte é legítima. Vários governos reduziram impostos dos ricos e das grandes corporações, injetaram recursos no sistema financeiro sem o mínimo de controle ou critério.

Agora, os que foram historicamente beneficiados com recursos públicos do Estado, dinheiro dos trabalhadores, querem que esses mesmos trabalhadores paguem pela crise. Isso nós não podemos permitir, sob risco de colocar em risco a soberania popular, a manutenção da própria democracia, colocada em xeque pelos ultimatos dados pelos monopólios financeiros e pela subserviência de alguns governos.

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