Quando Reynaldo Gianecchini e Camila Pitanga foram à televisão em abril como garotos-propaganda dos bancos públicos, os atores conseguiram levantar o ibope de uma ferramenta já velha, mas praticamente desconhecida dos brasileiros: a portabilidade de operações de crédito, criada em 2006.
Dados do Banco Central mostram que o número de operações de troca de dívida cresce desde maio, logo depois que começou a ofensiva da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil para conquistar clientes dos concorrentes. Camila Pitanga anunciou, em horário nobre, uma “redução drástica de juros” na Caixa, e Gianecchini, “crédito para antecipar seus sonhos” no BB.
Foram promessas que levaram alguns brasileiros endividados às ruas, querendo trocar parcelas mais altas por outras mais baixas no banco concorrente, em um movimento que atingiu proporção recorde no país. De maio a julho, foram fechadas aproximadamente 45 mil operações de portabilidade por mês, somando R$ 520 milhões mensais, sendo que a maior parte é de crédito consignado. Na série histórica do Banco Central, iniciada em dezembro de 2006, esses patamares não tinham sido alcançados por três meses consecutivos antes.
É certo que esse volume ainda não atinge nem 1% dos desembolsos mensais de crédito para pessoas físicas no Brasil, mas dá sinais da evolução que vem ocorrendo. Em nenhum outro mês deste ano havia se chegado a esse nível de transações por mês. Os volumes mais altos tinham sido de 32,7 mil operações em março e, em valor, de R$ 383 milhões em janeiro.
Diversos estudos internacionais apontam que a portabilidade é uma ferramenta importante para estimular a concorrência entre bancos. Por aqui, o BC sabe que isso só está começando, mas que as campanhas do BB e da Caixa trouxeram um importante estímulo. Depois que os bancos públicos foram à televisão, outras instituições privadas também resolveram mostrar suas ofertas.
Não há números públicos que mostrem quem ganhou e quem perdeu empréstimos dos concorrentes. Mas os balanços dos bancos de abril a junho apontam que as instituições públicas – muitas vezes sacrificando suas margens em prol da decisão do governo de aquecer a economia – tiveram um avanço maior da carteira de crédito. Caixa (+5,1%) e Banco do Brasil (+3,1%) também conquistaram, proporcionalmente, mais correntistas do que Bradesco (+ 0,8%) e Santander (+2,1%). O Itaú Unibanco não divulga esse dado.
Para o BC, os números da portabilidade de crédito acabam escondendo um movimento maior que pode ter ocorrido desde que os bancos públicos anunciaram redução de taxas. O argumento da autoridade é que muitos devedores podem ter usado de seu poder de barganha para conseguir descontos nas próprias instituições onde tomaram o empréstimo.
O Banco do Brasil sentiu esse efeito. Muitos clientes, ao verem as propagandas do banco com taxas mais baixas do que aquelas que estavam pagando, buscaram renegociar suas dívidas dentro do próprio BB. O volume de renegociações alcançou R$ 16 bilhões, 60% maior do que um ano antes. Em teleconferência com analistas, Ivan Monteiro, vice-presidente de relações com investidores, explicou que a maior parte dessa expansão se deve a clientes do banco que trocaram um crédito com taxa mais alta por juros mais baixos.
Quando se trata da troca de um banco para outro, o avanço da portabilidade esbarra em problemas técnicos. No caso de financiamento de automóveis, por exemplo, um dos problemas é a liberação da garantia do carro de um banco para outro. Enquanto a transferência da dívida é feita em um dia, a mudança na garantia é mais lenta.
“Para conseguir fechar esse tipo de portabilidade, temos de dar um voto de confiança de que a garantia vai para o banco. É um processo que leva até dez dias”, diz Alexandre Abreu, vice-presidente de negócios de varejo do Banco do Brasil. O banco começou a adotar esse procedimento no fim de maio. No fim de julho, tinha fechado 5.100 operações, com R$ 150 milhões.
No crédito imobiliário, a transferência ainda esbarrava nos custos cartorários até meados deste mês. Uma lei, porém, reduziu esses gastos.