Como comprar um banco e lucrar com a crise

As crises da economia capitalista provocam recessão, desemprego, desespero, crimes e suicídios, falências …mas também excelentes negócios. Principalmente para os maiores monopólios, que estão no topo da cadeia alimentar, como por exemplo o JP Morgan Chase, um dos maiores bancos dos Estados Unidos. Com a preciosa ajuda do Federal Reserve, o banco central dos EUA, ele acaba de comprar o Bear Stearns por uma pechincha: US$ 236 milhões.

Calcula-se que só a sede do Bear no número 383 da Madison Avenue, em Manhattan, vale quatro vezes essa quantia. O edifício é um gigante octogonal de granito e vidro, com 47 andares e 237 metros, um monumento da arquitetura novaiorquina pós-moderna, de gosto suspeito mas sem dúvida imponente.

O JP Morgan conseguiu comprar o banco menor (que no entanto era o quinto do país na área de investimento) por US$ 2 a ação. No entanto, nos últimos 13 anos elas sempre estiveram cotadas acima dos US$ 20. Mesmo no fim do pregão de sexta-feira, quando se soube que a instituição estava a perigo e suas ações desabaram 47% em um dia, fecharam cotadas a US$ 30,85.

O colosso “admirado” virou mico

Durante décadas o arranha-céu granítico da Madison Avenue funcionou como encarnação da suposta solidez do Bear Stearns. Ali atuou seu presidente por duas décadas, Alan “Ace” Greenberg, figura legendária da comunidade de Wall Street, famoso por recomendar aos seus 15 mil funcionários que aproveitassem os clipes usados e emendassem os elásticos arrebentados para permitir o reaproveitamento.

Sabe-se que não foram os clipes e elásticos que fizeram a fortuna do banco, e sim as operações de alto risco no mercado imobiliário. Aparentemente, era um risco compensador. O Bear figurou entre 2005 e o ano passado (!) como a empresa “mais admirada” na área de seguros, conforme a lista das “Companhias mais admiradas da América”, elaborada pela revista Fortune.

Mas veio a crise do subprime (hipotecas imobiliárias de solvência sob suspeita). E o colosso veio abaixo, depois de confessar na sexta-feira passada (14) que sua liquidez “se deteriorou de forma significativa”.

Depois da sexta, o Bear Stearns talvez não achasse comprador nem pelos irrisórios US$ 236 milhões, ou até de graça. Havia a suspeita de que era um ciclópico mico, uma massa falida.

Um presente do Federal Reserve

No entanto, desde antes mesmo do anúncio, já o JP Morgan acertava o concurso do Fed, como é chamado o Federal Reserve. Este decidiu fornecer ao Bear um empréstimo de emergência, de US$ 30 bilhões, que poder ser coberto pelos papéis micados. E manteve a oferta, agora para o Morgan, depois que a transação se consumou. Na verdade estava tudo combinado.

Os US$ 30 bilhões serão trocados por títulos com baixíssima liquidez e alto risco em poder do Bear. São portanto quase um presente do Fed. Com eles, o JP Morgan pode praticamente cobrir a exposição do banco adquirido, que é calculada em US$ 33 bilhões. É fácil correr “riscos” quando se tem o banco central como rede de segurança.

As interrogações são muitas. Nesta segunda-feira (17), primeiro dia útil após a transação, as bolsas patinaram em Nova York e recuaram no resto do mundo, Brasil inclusive. Poucos têm dúvida de que o JP Morgan fez um negócio da China. Mas é a saúde do sistema como um todo que inspira cuidados.

Quais bancos valem alguma coisa?

A megacompra atestou o tamanho e a gravidade da crise financeira nos EUA. David Goldman, economista e ex-chefe da área de pesquisa do Bank of America, observa que “para o preço de venda do Bear chegar a praticamente zero, contrariando as expectativas do mercado, é que algo está sistemicamente muito errado e estamos em um momento perigosíssimo”.

“A principal preocupação, diante das vantagens que o JP Morgan teve para adquirir o Bear, é saber quais outras instituições financeiras valem alguma coisa no ambiente atual”, comenta por sua vez Timothy Ghriskey, da ONG americana Solaris.

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