Um grupo de três estudantes que participam da ocupação da escola Estadual Fernão Dias Paes, em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, segue para uma audiência de conciliação, às 15h, na 5ª Vara da Fazenda Pública, no centro. Caso não haja acordo, a ordem de reintegração de posse expedida ontem (12) poderá ser cumprida em até 24 horas. Na audiência, eles pretendem pedir que o secretário da Educação, Herman Voorwald, vá até a escola para uma reunião; que nenhum deles sofra sanção administrativa e que os que saírem possam voltar. Na saída da escola, os alunos tentaram impedir que a van que levava os alunos seguisse adiante porque eles não estão acompanhados por advogados. Houve um tumulto, a Polícia Militar atuou e o carro seguiu apenas com dois representantes do Conselho Tutelar acompanhando os estudantes. Há informações de que os alunos são esperados por dois defensores públicos no fórum.
"Nós não vamos negociar a saída da escola. Vamos negociar uma nova proposta de reorganização que seja discutida com a comunidade escolar. A escola não tem nem vaso sanitário suficiente, e não pode receber alunos de outras escolas, como pretende o governo", disse um aluno. A Fernão Dias, pela reorganização, passaria a ter apenas ensino médio diurno, recebendo alunos de outras escolas, aumentando o número total. As vagas para o ensino fundamental seriam fechadas.
Por telefone, um dos estudantes da ocupação garantiu que estão dentro da escola apenas alunos do ensino médio e que neste momento eles ocupam uma área comum do prédio. O jovem preferiu não dar informações sobre como conduzirão a audiência de conciliação e tampouco divulgou o número de pessoas que ocupam escola.
Pela manhã, um grupo de trabalhadores ligados ao Sindicato dos Bancários de São Paulo e ao Sindicato dos Trabalhadores da USP chegou ao local cantando palavras de apoio à ocupação. Os dois quarteirões em frente à escola continuam sitiados pela Polícia Militar, que desde quarta mantém um cordão de isolamento do prédio. Nesta noite, duas pessoas tiveram autorização para entrar no prédio. Estudantes e militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) continuam acampados em frente ao prédio.
A Escola Estadual Fernão Dias Paes, localizada na Avenida Pedroso de Morais, em Pinheiros, foi ocupada pelos alunos na manhã de terça (10). Na noite de quarta, a Justiça determinou a reintegração de posse dessa unidade de ensino. Antes, na segunda-feira, foi ocupada a E.E. Diadema, na cidade de mesmo nome, no ABC paulista.
Ontem, jovens contrários à proposta do governo do estado ocuparam as escolas Salvador Allende, no bairro José Bonifácio, região de Itaquera, na zona leste, e Castro Alves, na Vila Mazzei, zona norte. Além dessas, mais duas unidades estaduais, a escola Professora Heloísa de Assumpção, localizada em Quitaúna, na cidade de Osasco, e a Valdomiro Silveira, em Santo André, também no ABC, tiveram as dependências ocupadas
"Escola fechada é um escândalo. Toda sociedade deveria estar protestando junto com os estudantes", afirmou o professor da Universidade de São Paulo, Henrique Carneiro, que chegou pela manhã à ocupação, junto à esposa e ao filho de nove anos, para apoiar os estudantes. "Esta medida vai superlotar a sala de aula e separar família. Nós que atuamos na área sabemos que não há justificativa pedagógica para separar alunos por idade. Nas famílias e nos bairros eles convivem com pessoas de diferentes faixas etárias e crescem com isso. Não é uma medida pedagógica, mas sim política", disse a professora da Universidade de Mogi das Cruzes, Silvia Miskulin.
A Procuradoria-Geral do Estado entrou na Justiça na quarta-feira (11) com um pedido de interdição do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) de forma a garantir que a entidade fosse obrigada a se manter distante do prédio da Secretaria da Educação, localizado na região central de São Paulo.
No mesmo processo foi pedida a integração de posse da Fernão Dias, da escola Estadual Salvador Allende, na zona leste , e da escola Estadual Diadema e município de mesmo nome. A Justiça se considerou incompetente de julgar a ocupação desta última escola, pelo fato de ela não estar localizada na capital paulista. A determinação de reintegração de posse da Salvador Allende aguarda parecer do Ministério Público.
No sábado (14), quando ocorrem as reuniões de pais, os estudantes e militantes de movimentos sociais vão fazer uma vigília nas 94 escolas que serão fechadas, e alertar para os pais que a chamada "reorganização" tem outras motivações por trás, como cortes de investimentos em setores essenciais por parte do governo paulista.
Outro ato de protesto será o boicote às provas do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp), programadas para serem aplicadas nos próximos dias 24 e 25.
O governo Alckmin justificou o fechamento das escolas dizendo que vai reunir apenas alunos do mesmo ciclo – fundamental I e II e médio – nas escolas e com isso melhorar a qualidade do ensino. Professores e estudantes temem que as mudanças levem à superlotação de salas, demissão de docentes e à redução de salário decorrente da redução de jornada. Além disso, a Apeoesp acredita que o número de escolas a serem fechadas será muito maior.
Apesar dessa crise de superlotação no início do ano, o secretário Voorwald afirmou ao telejornal Bom Dia São Paulo, em 22 de setembro, que São Paulo tem 2 milhões de vagas ociosas. "O momento é absolutamente apropriado para isso porque houve redução de dois milhões de alunos na rede, a estrutura física que foi preparada há mais de 20 anos para receber 6 milhões de alunos em um processo de universalização, hoje, por conta da queda na taxa de natalidade, viabiliza que eu tenha escolas ociosas. A rede foi desenvolvida para absorver até 6 milhões de alunos, hoje tem 4 milhões."
Ângela, da Upes, defendeu em entrevista à RBA que essa "janela demográfica" seja usada para reduzir o número de estudantes por sala de aula, uma reivindicação histórica do movimento estudantil. “Nos últimos dez anos, a rede pública diminui quase 2 milhões de estudantes. Uma parte evadiu, mas pelo menos 600 mil ingressaram em escolas particulares. A rede privada de ensino aumentou 36%, um dado muito preocupante, que evidencia um projeto de privatizar a educação.”
Professores ligados à Apeoesp concordam e reivindicam que a estrutura das escolas seja otimizada para que as salas de aula tenham no máximo 20 alunos, em qualquer dos ciclos. Os docentes reclamam ainda que a chamada reorganização da educação foi anunciada sem nenhuma discussão prévia com a comunidade escolar e com entidades ligadas à educação. O governo Alckmin já havia adotado a mesma postura com o Plano Estadual da Educação, elaborado pelo governo e apresentado pelo à Assembleia Legislativa por Alckmin sem participação popular.
São Paulo tem hoje 5.108 escolas, das quais 1.443 são de ciclo único. Outras 3.186 mantêm dois ciclos e 479 escolas têm três ciclos. Essas últimas devem ser transformadas em escolas de ciclo único, assim como grande parte das de dois ciclos. Só neste ano, pelo menos 3.390 salas de aula foram fechadas no estado. Muitas escolas iniciaram o ano letivo com até 60 estudantes por classe, em turmas do ensino regular, e até cem estudantes por classe em turmas da Educação de Jovens e Adultos (EJA), segundo a Apeoesp.
No último dia 15, depois de uma série de mobilizações estudantis, o Ministério Público Estadual e a Defensoria Pública de São Paulo cobraram explicações do governo sobre o projeto da suposta "reorganização" do ensino. Os processos estão em andamento.