O fio condutor do evento que juntou nesta quinta-feira (3), entre 10h e 12h30, seis centrais sindicais e entidades patronais de diversos ramos econômicos era a necessidade de implementar com urgência medidas que façam o país voltar a crescer, pensando inclusive em "salvar" 2016, ainda que parcialmente. Nesse sentido, os discursos foram próximos, enfatizando a importância de mudança de rumos na economia. No plano político, as posições já não foram tão uniformes, variando desde o ataque frontal ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por admitir um processo de impeachment, a opiniões neutras ou, no mínimo, cautelosas.
Para o presidente da Abimaq (entidade que representa a indústria de máquinas e equipamentos), Carlos Pastoriza, o que aconteceu ontem na Câmara pode inicialmente agravar a crise, mas também servir de impulso "para que esse movimento (referindo-se ao encontro de hoje), que é de superação, seja mais relevante ainda". Mas é preciso rapidez, cobrou. "Precisamos superar a crise política para depois promover o crescimento econômico. Superar de forma rápida. Temos de virar essa página. Tem de haver celeridade dos poderes", afirmou, na saída do ato, ocorrido em casa de evento no bairro da Liberdade,
Segundo Pastoriza, a crise política influencia, negativamente, decisões sobre consumo e investimentos. E a crise econômica não tem fatores externos. "Poucos anos atrás, o Brasil estava em um momento esfuziante. O que mudou? Essencialmente, nada. O que está acontecendo aqui é o que eu chamo de jabuticaba. Nós, brasileiros, provocamos essa crise. O meu setor é o que mais está sentindo os efeitos dessa crise maluca que construímos do nada", afirmou.
Sobre o processo de impeachment, o executivo disse não ter elementos para avaliar sua procedência. Mas pediu que, seja qual for a decisão, deve ser rápida. "Enquanto a classe política está lá se batendo, nós estamos afundando aqui."
O diretor-superintendente da Abit (indústria têxtil), Fernando Pimentel, viu no encontro um alento, "um tiro de largada" para mudanças necessárias na economia. "O que nos divide sabemos resolver nas mesas de negociação. Tenho certeza de que o item que precisamos tratar de resgatar é a confiança. Não podemos dar 2016 como perdido." Para o presidente da Anfavea (associação das montadoras), Luiz Moan, caso a agenda proposta hoje seja implementada, o próximo ano pode significar um "ponto de virada".
Nova agenda
O secretário-geral da CUT, Sérgio Nobre, pediu mudança de foco. "O debate que tem de ser feito é como voltar a crescer. A nossa agenda não é crise, Operação Lava Jato, impeachment, é como voltar a crescer", afirmou, acrescentando que a central defende investigações, apurações e punições, mas para as pessoas físicas que cometeram crimes, não impedindo as empresas de firmar contratos e atuar em projetos, o que tem paralisado a economia. "As conquistas sociais e econômicas não podem se perder. E podem se perder não por causa de uma crise econômica, mas de uma crise potencializada pela situação política. Este ato é importante, nós unimos os atores em torno de uma agenda."
Nesse sentido, diz Sérgio Nobre, a decisão tomada ontem pelo presidente da Câmara se choca com o objetivo do evento. "Que triste para um país como o nosso ter alguém que pensa no problema dele e não no país. Ele perdeu as condições de comandar a Casa. Esse caminho não interessa a ninguém. Agora é momento de ter responsabilidade. A disputa política é legítima, ela se resolve na urna e não com ação irresponsável para potencializar a crise", afirma o sindicalista.
"Vamos para a rua para impedir o impeachment. Mais do que isso, para impedir o retrocesso", avisa o presidente da CUT, Vagner Freitas. "O povo outorgou um mandato que vai até 2018", acrescenta. "Não pode ser interrompido por manobras de Cunha. Há uma crise política construída por aqueles que perderam a eleição."
Da mesma forma, diz Vagner, o processo não pode continuar paralisando a economia – que também exige mudanças de rota. "Todos os que estão aqui são contra essa política econômica recessiva. O Levy (referindo-se ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy) não dialoga, ele não é um desenvolvimentista, é um rentista."
Neutralidade e ativismo
O presidente da Força Sindical, Miguel Torres, avalia que a discussão do impeachment não dificulta as negociações pela volta do crescimento econômico. Segundo ele, a central atua com "neutralidade" nessa questão, respeitando as posições partidárias de seus dirigentes. "Quem vai decidir é o Congresso. Independentemente de quem estiver lá (no governo), nós vamos conversar. A Dilma já teve chance de fazer alguma coisa e não fez", afirma Miguel, pregando "neutralidade, mas ativismo na agenda do desenvolvimento".
Miguel também garantiu que o presidente licenciado da central, o deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, líder do Solidariedade e defensor do impeachment, não interfere nas decisões da Força. "Ele expõe suas opiniões", diz, acrescentando que não há pressão, nem oposição, por parte de Paulinho. "Nosso contato (da Força) com Cunha é institucional, como foi com Marco Maia, (Arlindo) Chinaglia, João Paulo", acrescenta o dirigente da Força, que também é o 1º vice-presidente do Solidariedade.
Sobre um ato contra o impeachment organizado pela CUT, o dirigente da Força foi claro. "Não vamos entrar nisso. Estamos juntos na agenda do desenvolvimento."
O secretário-geral da Força, João Carlos Gonçalves, o Juruna, o processo de impeachment "não é o fim do mundo, por estar previsto na Constituição", embora tenha sido resultado de uma "jogada antidemocrática" de Cunha. Para ele, isso pode proporcionar um debate mais amplo na sociedade.
O presidente da CTB, Adílson Araújo, não vê na normalidade institucional uma exigência para que o Brasil retome seu crescimento, "que se reconstrói a partir de um compromisso", com demonstração de vontade política. Também é preciso pressionar por mudanças na economia. "É preciso uma agenda de resistência, pressionar o governo, o Congresso, reforçar a Frente Brasil Popular. A nossa agenda é da democracia e da soberania, e do mandato da presidenta constitucionalmente eleita."
Ele também critica Cunha: "Não reúne condições morais, políticas ou éticas. Fica mais claro que já passou da hora de ele se afastar da presidência da Câmara. Sua posição é chantagista, imoral e golpista". O dirigente considerou o ato de hoje uma demonstração de maturidade política, em um momento de declínio da indústria e efeitos nocivos da Lava Jato na economia.
Já o presidente da CSB, Antônio Neto, foi mais cauteloso em relação ao impeachment e mais enfático na crítica ao governo e ao "rame-rame entre Congresso e Planalto". Para ele, se for apenas pelas "pedaladas fiscais", como diz Cunha, não haveria condições para se propor o impeachment. "Se aparecerem outras coisas, não sei."
Para ele, o governo Dilma adotou "a agenda mais conservadora dos últimos anos", o que provocou perda de apoio político. "Para ter adesão, você precisa de uma agenda que não leve para a recessão. Não foi esse o projeto que eu apoiei para eleger o governo. Com um projeto antipopular, é difícil ter apoio."
Mesmo a sustentação da coalizão chegou a ser questionada durante o encontro de hoje. Um dirigente do PMDB, por exemplo, queixou-se e não garantiu permanência na base: "A relação com o PT não é republicana".
Um documento foi aprovado de forma simbólica pelas aproximadamente 500 pessoas presentes, levadas pelas centrais sindicais. O chamado Compromisso pelo Desenvolvimento, com várias diretrizes e propostas de retomada da economia, será levado na semana que vem a Brasília e apresentado ao governo. Está previsto encontro na próxima quarta-feira (9) com a presidenta Dilma.