Por Maria Rita Serrano
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) completa 50 anos em 13 de setembro. Seus recursos impulsionam, hoje, setores essenciais como habitação popular, saneamento básico, infraestrutura e mobilidade urbana. Com a consolidação do governo golpista, porém, o quadro deve mudar. Bancos privados estão alvoroçados para abocanhar esse dinheiro, retirando o monopólio da gestão da Caixa.
“Concorrência de bancos pelo FGTS interessa ao trabalhador”, escreveu a colunista de O Globo, Miriam Leitão em artigo, em clara campanha da imprensa pela partilha dos recursos pelos bancos privados. O argumento principal de que assim haveria concorrência por melhores taxas de rendimento é uma grande falácia, já que o rendimento do fundo é determinado, por legislação, em 3% mais TR. Favorecer essa mudança seria mais um entre os muitos retrocessos que rondam os brasileiros desde que os golpistas tomaram o poder.
Só para lembrar, desde 1986 o FGTS passou a ser gerido pela Caixa e, cinco anos depois, por determinação legal, as contas a ele vinculadas foram transferidas à Caixa pelos bancos depositários. A transferência favoreceu sobremaneira a gestão e o controle do fundo, o que não ocorria quando os depósitos estavam divididos entre os diversos bancos, pois os recursos eram remunerados de forma aleatória, causando danos ao patrimônio dos trabalhadores – fato registrado, inclusive, em relatório produzido por comissão instaurada pelo TCU no ano de 1989, criada para avaliar e fiscalizar o controle das contas.
Outra ameaça que nesse momento paira sobre o FGTS é o desvio de recursos para o BNDES que, por sua vez, vai financiar projetos do Programa de Parcerias de Investimentos, previsto na MP 727 – na prática, retomando o projeto privatista de FHC. Ou seja: o dinheiro dos trabalhadores será usado para privatizações e concessões em áreas estratégicas por um governo ilegítimo e sem voto. A intenção é clara: desembolsar os cerca de R$ 12 bilhões de saldo do FI do FGTS e coloca-los à disposição do capital privado, que fará obras de infraestrutura sem qualquer questionamento, já que a própria MP deixa claro que as medidas de desestatização serão implementadas por decreto, como “prioridade nacional”, passando por cima de “barreiras democráticas”.
Criado em plena ditadura, o Fundo de Garantia nasceu “optativo”: se aceito, substituía a estabilidade no emprego adquirida após 10 anos de empresa. À época, os trabalhadores denunciaram a ocorrência de demissões caso a opção pelo fundo não ocorresse. Por outro lado, também havia denúncias de que os patrões demitiam quando o empregado estava prestes a adquirir a estabilidade, o que tornaria o fundo alternativa mais viável. Na Constituição cidadã, de 1988, o regime de estabilidade, já em desuso, deixou de existir. E o FGTS foi estabelecido como um direito extensivo ao trabalhador rural.
Para o empregado registrado, o fundo funciona como uma espécie de combinação de poupança e seguro, que pode ser sacado em situações como doenças graves, compra de moradia, aposentadoria. Para o País, os recursos do FGTS são uma mola propulsora do desenvolvimento. Só no primeiro semestre deste ano a arrecadação do FGTS na Caixa atingiu R$ 59,7 bilhões e, os saques, R$ 53,2 bilhões –em junho de 2016, o Fundo era composto por 150,1 milhões de contas.
Do total de R$ 38,1 bilhões de contratações da carteira de crédito habitacional no semestre, R$ 29,9 bilhões vieram de recursos do FGTS. Para o Programa Minha Casa Minha Vida, por exemplo, foram contratados R$ 19,9 bilhões, o equivalente a 180,9 mil novas unidades habitacionais. E dessas novas moradias 15,5% foram destinadas à faixa do programa que contempla brasileiros com renda de até R$ 1,8 mil. No ano passado, da meta global de investimentos de R$ 76,8 bilhões do FGTS prevista para 2016, R$ 56,5 bilhões seriam direcionados para habitação, R$ 12,8 bilhões para infraestrutura urbana e R$ 7,5 bilhões para saneamento básico.
O FGTS, por certo, não nasceu como conquista dos trabalhadores. Hoje, porém, representa muito mais do que isso, tanto individual quanto coletivamente, com benefícios para toda a sociedade brasileira. O governo golpista não vai mudar as regras do jogo para entregar esse patrimônio ao mercado, porque não vamos deixar. Especialmente para os trabalhadores da Caixa, que conhecem bem o papel social do banco e a destinação do FGTS, a época é de grandes desafios. E grandes desafios exigem uma grande união para fortalecer a resistência: vamos juntos defender o Brasil para todos os brasileiros pois, ´Se é Público, é para todos´.
Maria Rita Serrano é coordenadora do Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas, representante dos empregados da Caixa Federal no Conselho de Administração, diretora do Sindicato dos Bancários do ABC (SP) e da Contraf-CUT. É mestra em Administração.
Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas
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