Valor Econômico
Vanessa Adachi, Graziella Valenti e Alex Ribeiro
A Caixa Econômica Federal vai comprar 49% do capital votante do Banco PanAmericano, em operação que seguirá moldes semelhantes à associação entre Banco do Brasil e Banco Votorantim neste ano. Pelo negócio, a Caixa deverá pagar algo em torno de R$ 750 milhões ao grupo Silvio Santos. Segundo o Valor apurou, a Caixa também deve comprar parte das ações preferenciais (PN) pertencentes ao empresário.
O grupo Silvio Santos detém, por meio de três empresas, 100% do capital votante do banco e 41,3% das ações PN. A Caixa ficaria com metade dessa fatia, algo em torno de 20% das PNs do PanAmericano. No total, portanto, o banco federal assumiria cerca de 37,5% do capital total do Panamericano.
Os contratos ainda não foram assinados, mas a negociação está próxima do fim. Diante do vazamento de informações, ontem, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) cobrou explicações do PanAmericano. Até o fechamento da edição o banco não havia enviado comunicado ao mercado. A Caixa não tem ações em bolsa. As ações do banco do grupo Silvio Santos têm subido fortemente, em parte por conta dos rumores da compra. Em novembro, o papel acumula alta de 41,98% e, no ano, valorização de 283,21%. Ontem, a ação PN fechou a R$ 9,30, com alta de 1,08%.
Toda a operação está sendo desenhada para que não configure aquisição de controle pela Caixa. Isso porque o PanAmericano, diferentemente do Votorantim, tem ações preferenciais negociadas em bolsa e, pelo estatuto social do banco, todos os preferencialistas têm direito a receber o mesmo valor pago ao controlador em caso de alienação do controle. Ou seja, a Caixa poderia ser obrigada a realizar oferta pública de aquisição de ações para os minoritários exercerem o direito de “tag along”.
Caixa e PanAmericano assinarão um acordo de acionistas para compartilhar a gestão do banco. No conselho de administração, o mais provável é que haja equilíbrio entre o número de representantes indicados por cada lado. Haverá também conselheiros independentes.
Na operação entre BB e Votorantim a questão da governança do banco foi a mais complicada e quase inviabilizou o fechamento do negócio. O Votorantim relutava em compartilhar a gestão e o BB não abria mão de ter papel decisivo.
A auditoria dos números do PanAmericano pela equipe da Caixa demorou mais do que o esperado e levou dois meses.
O maior atrativo do negócio para a Caixa é a atuação conjunta sobretudo nas áreas de financiamento para aquisição de veículos e empréstimos com consignação em folha de pagamento.
O modelo semelhante ao desenhado entre BB e Votorantim permitirá que o PanAmericano continue com controle privado e, portanto, mantenha agilidade para competir no mercado. Bancos do controle do governo têm mais restrições para operar, como a obrigatoriedade de fazer licitações para abrir agências e concursos públicos para contratar funcionários. A ideia é fazer uma blindagem para evitar nomeações políticas.
A aquisição de ações do PanAmericano será feito por meio da CaixaPar, a empresa de participações criada pela Caixa no início ano. Esse não deverá ser a única operação. O banco federal negocia parcerias semelhantes com outras instituições financeiras. O seu interesse inclui áreas como “leasing”, serviços financeiros como cartões de crédito e financiamentos a médias empresas.
Também está à procura de uma nova seguradora para oferecer seguro de financiamentos imobiliários, depois que uma medida provisória (MP) editada pelo governo extinguiu a exclusividade que o banco tinha com a Caixa Seguros nesse produto financeiro.
A busca de parceiros estratégicos é a forma encontrada pela Caixa para manter o rápido ritmo de expansão de sua carteira de crédito, que cresceu 61,9% nos 12 meses encerrados em setembro. O diagnóstico dentro do banco federal é que, para crescer mais rapidamente, será fundamental contratar crédito fora de suas agências, atuando no chamado segmento de não-clientes.
O chamado crescimento orgânico, pela abertura de novas agências, é particularmente caro e demorado em um banco público por causa de fatores como lei de licitações e obrigação de realização de concursos públicos. Além disso, o crédito contratado nas próprias agências tem um alto custo fixo, representado pelas instalações físicas e funcionários.
O objetivo, com as parcerias, é procurar os clientes fora das agências, por dois motivos. Primeiro, porque grande parte do crédito é contratada nas redes varejistas. Os consumidores, por exemplo, vão às agências de automóveis para comprar um carro e, na própria loja, contratam o crédito.
Hoje, a Caixa tem poucas parcerias com redes varejistas. Segundo motivo: fora das agências, a Caixa trabalha sobretudo com custos variáveis, como comissões para a contratação das operações de crédito.
O Banco PanAmericano tem uma posição bastante consolidada em financiamentos de automóveis. Sua carteira no segmento somava R$ 3,251 bilhões em junho, ou 50,3% de sua carteira de crédito, segundo o balanço mais recente do banco. A Caixa não diz em seu balanço quanto é sua carteira de veículos.
Em setembro de 2009, a rubrica do balanço denominada “outros créditos”, entre os quais se incluem financiamentos de veículos, somava R$ 883 milhões. É pouco, comparado com uma carteira de crédito de R$ 111,958 bilhões registrada no balanço.
Para o PanAmericano, a lógica da operação é ter uma base de captação mais estável e com custos mais baixos, que só um grande banco de varejo é capaz de proporcionar. Sem rede de varejo, o PanAmericano capta sobretudo por meio de depósitos a prazo de grandes clientes, com juros relativamente altos, se comparados com os bancos de varejo.
A estrutura mais cara de captação faz com que, do lado do ativo, o banco procure emprestar nos segmentos mais rentáveis do mercado. Sua presença no segmento de veículos novos, com margens mais apertadas, é menor do que no segmento de semi-novos, com até cinco anos de uso.
O banco também opera no segmento de veículos com mais de cinco anos de uso. Uma parceria com a Caixa permitiria ao banco captar mais barato e atuar mais fortemente no segmento de veículos novos.
Além de veículos, outro segmento forte no PanAmericano é o crédito consignado, com R$ 952 milhões em junho, ou 16,6% da carteira. O banco também atua na área de leasing (a Caixa não tem empresa no segmento) e em cartões de crédito.
Banco PanAmericano perdeu depósitos na crise, mas agora se recupera
Fernando Travaglini, de São Paulo
O PanAmericano sofreu bastante com a crise. Os depósitos a prazo recuaram de um patamar superior a R$ 2,3 bilhões, no meio de 2008, para cerca de R$ 1,5 bilhão no fim do ano, queda de mais de um terço logo após o agravamento da crise. A solução foi a cessão de carteira e boa parte foi feita com a Caixa. Foi então que o relacionamento das instituições se estreitou.
Segundo uma fonte de mercado, a operação faz bastante sentido do ponto de vista do PanAmericano. Isso porque as empresas do Grupo Silvio Santos não vivem um momento muito rentável. A única empresa em situação confortável seria o SBT, disse uma fonte que teve acesso aos números do grupo.
O mercado não costuma ver com bons olhos um banco integrado a um grupo empresarial, cujas empresas não são muito lucrativas. Primeiro porque há uma concorrência pelo funding, já que financiar uma empresa é mais rentável do que um banco. Segundo, pelo fato de uma instituição financeira viver de credibilidade e ficar suscetível a rumores que envolvam a situação financeira do grupo ou parte dele.
O banco tem como foco operações de pessoas físicas, com cerca de dois terço dos ativos em financiamento de veículos (CDC e leasing). Desde o agravamento da crise, houve uma forte retração de sua carteira de varejo, em parte pela redução do apetite de risco e também pelo corte de pessoal. Segundo dados do sindicato dos bancários, dos cerca de 100 funcionários da área de crédito, 80 foram desligados.
Mas a instituição vinha num processo de recuperação nos últimos meses e o balanço foi relativamente bem recebido pelos analistas. O Banco PanAmericano fechou o terceiro trimestre com lucro líquido de R$ 46,7 milhões, queda de 6,7% em relação aos três meses anteriores e recuo de 28,5% sobre o mesmo período do ano passado.
Apesar disso, já apresentou recuperação das concessões de crédito.
As novas operações de crédito para automóveis cresceram 43% no trimestre e o saldo total da carteira atingiu R$ 9,3 bilhões, expansão de 2,7% em relação ao nível de junho deste ano. Isso elevou em 24% a receita com intermediação financeira com crédito.
Outro dado positivo foi a melhora nos atrasos acima de quinze dias, que derrubou as despesas com provisão para crédito de liquidação duvidosa. A liquidez também está recuperada e os depósitos a prazo superam os R$ 3,5 bilhões.