Por 3 votos a 2, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) admitiu a possibilidade jurídica do pedido de reconhecimento da união estável entre homossexuais e determinou que a Justiça Fluminense retome o julgamento da ação envolvendo o agrônomo brasileiro Antônio Carlos Silva e o canadense Brent James Townsend, que foi extinta sem análise do mérito. Foi a primeira vez que o STJ analisou os direitos de um casal homossexual com o entendimento de Direito de Família e não do Direito Patrimonial.
Com o voto desempate do ministro Luís Felipe Salomão, a Turma, por maioria, afastou o impedimento jurídico para que o mérito do pedido de reconhecimento seja analisado em primeira instância. Luís Felipe Salomão acompanhou o entendimento do relator ressaltando, em seu voto, que a impossibilidade jurídica de um pedido só ocorre quando há expressa proibição legal e, no caso em questão, não existe nenhuma vedação para o prosseguimento da demanda que busca o reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo.
O casal entrou com ação de reconhecimento da união na 4ª Vara de Família de São Gonçalo (RJ) alegando que eles vivem juntos há quase 20 anos de forma duradoura, contínua e pública. O pedido foi negado e o processo extinto sem julgamento do mérito.
Eles recorreram ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), que também rejeitou a proposta por entender que não há previsão legal para tal hipótese na legislação brasileira. Legalmente casados no Canadá, o casal busca a declaração de união estável com o objetivo de obter visto permanente para o canadense, de modo que os dois possam morar definitivamente no Brasil.
Diante de mais uma derrota, eles recorreram ao STJ, onde o julgamento estava empatado. Os ministros Pádua Ribeiro (relator) e Massami Uyeda votaram a favor do pedido por entender que a legislação brasileira não traz nenhuma proibição ao reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo. Os ministros Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior negaram o recurso por entender que a Constituição Federal só considera como união estável a relação entre homem e mulher como entidade familiar.
O ministro Luís Felipe Salomão também ressaltou que o legislador, caso desejasse, poderia utilizar expressão restritiva de modo a impedir que a união entre pessoas do mesmo sexo ficasse definitivamente excluída da abrangência legal, mas não procedeu dessa maneira. Ele concluiu seu voto destacando que o STJ não julgou a procedência ou improcedência da ação – ou seja, não discutiu a legalidade ou não da união estável entre homossexuais -, mas apenas a possibilidade jurídica do pedido. O mérito será julgado pela Justiça fluminense.
Homoafetivos
Este foi um dos temas prioritários na negociação bancária do ano passado e que neste ano é retomada com a isonomia de tratamento para homoafetivos. “Significa que parceiros do mesmo sexo tenham os mesmos direitos que os casais heterossexuais na CCT”, explica Arlene Montanari, secretaria de Políticas Sociais da Contraf/CUT.
“O tema foi rejeitado em 2007 sem que houvesse sequer uma análise”, lembra Arlene.
A isonomia de tratamento para homoafetivos está presente no artigo 67 e diz sobre as vantagens legais, convencionais ou contratuais que se aplicam aos parceiros (as) de trabalhadores(as) abrangidos por esta convenção, que serão também aplicáveis aos casos em que a relação de união civil decorra de relacionamento homoafetivo, considerando-se para os efeitos legais a mesma condição de cônjuges. É composto em dois parágrafos:
§ 1º – A comprovação da condição de parceiro(a) se dará com fulcro nos princípios da Constituição Federal e legislação infraconstitucional aplicável para os casais heterossexuais .
§ 2º – No caso de adoção por casal homoafetivo, deverão ser observadas as mesmas garantias estabelecidas para os casais heterossexuais.
Arlene ressalta que alguns bancos que compõem a mesa de negociação já possuem ações em torno da questão. São eles: banco Real, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e HSBC. A CASSI (plano de saúde do BB), aprovou em julho de 2008 a inclusão de dependentes de casais homoafetivos no plano de associados. Veja mais detalhes aqui.
Direito Patrimonial
O direito patrimonial de casais do mesmo sexo não é novidade no STJ. A Corte já possui jurisprudência sobre várias questões patrimoniais -pensão, partilha de bens etc. – envolvendo casais homossexuais. O primeiro caso apreciado no STJ (Resp 148897) foi relatado pelo ministro Ruy Rosado de Aguiar, hoje aposentado. Em 1998, o ministro decidiu que, em caso de separação de casal homossexual, o parceiro teria direito de receber metade do patrimônio obtido pelo esforço comum.
Também já foi reconhecido pela Sexta Turma do STJ o direito de o parceiro (Resp 395804) receber a pensão por morte do companheiro falecido. O entendimento, iniciado pelo ministro Hélio Quaglia Barbosa quando integrava aquele colegiado, é que o legislador, ao elaborar a Constituição Federal, não excluiu os relacionamentos homoafetivos da produção de efeitos no campo do direito previdenciário, o que é, na verdade, mera lacuna que deve ser preenchida a partir de outras fontes do direito.
Em uma decisão mais recente (Resp 773136), o ministro Humberto Gomes de Barros negou um recurso da Caixa Econômica Federal que pretendia impedir que um homossexual colocasse seu companheiro como dependente no plano de saúde. Segundo o ministro, o casal atendia às exigências básicas para a concessão do benefício, como uma relação estável de mais de sete anos e divisão de despesas, entre outras.
Processo: Resp 820475