Justiça aceita gravações, fotos e e-mails como provas em processos trabalhistas

A Justiça aceita como prova em processos trabalhistas quaisquer tipos de documentos, recibos, gravações, fotos e e-mails desde que as informações tenham sido obtidas de forma lícita, segundo juízes e advogados ouvidos pelo G1. São consideradas provas lícitas aquelas que não foram roubadas ou obtidas de forma irregular, como gravações clandestinas. Isso significa, por exemplo, que um grampo ilegal no telefone do chefe não pode ser juntado aos autos.

No entanto, um entendimento do Supremo Tribunal Federal permite gravações da própria conversa mesmo que o interlocutor não tenha conhecimento. Ou seja, o trabalhador pode colocar um gravador no próprio telefone ou uma câmera escondida em sua estação de trabalho e tornar isso parte do processo.

Atualmente, são quase 200 mil processos em andamento somente no Tribunal Superior do Trabalho (TST). Os tipos mais comuns de ações se referem a pedido de pagamento de hora extra, reconhecimento de vínculo empregatício, equiparação salarial, dano moral, rescisão indireta do contato e indenização por acidente de trabalho.

Testemunhas

Na avaliação de magistrados e advogados trabalhistas ouvidos pelo G1, embora muitas sejam as provas a serem utilizadas em processos, as testemunhas são decisivas nas ações trabalhistas, seja para um lado ou para outro.

O advogado trabalhista Eli Alves da Silva, conselheiro da Ordem dos Advodados do Brasil (OAB) de São Paulo, destaca que gravações e e-mails, embora aceitas, não são “provas cabais”, mas podem se tornar “robustas” após uma testemunha confirmar sua veracidade.

“Algumas provas não podem ser cegamente aceitas como se fossem definitivas porque há possibilidade de manipulação. Pode ter alguém de má fé que deixe senha de acesso com colega que possa mandar mensagem para quem quer que seja fora do horário de trabalho, por exemplo”, avaliou Silva.

Para o advogado, as testemunhas, que podem legitimar outras provas, devem ser cuidadosamente escolhidas, para não serem questionadas pela parte contrária no processo.

“Se a parte souber que são, por exemplo, amigos fora do trabalho, que foi ao casamento, almoça junto no fim de semana. Se alguém está sabendo disso, pode ser testemunha para a contradita (questionamento do depoimento da testemunha)”, explica Silva.

O juiz paulista Marcos Fava, que atua no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª região, São Paulo, diz, porém, que os juízes sempre ponderam o grau de amizade entre a parte e a testemunha.

“Amizade é ser padrinho de casamento, de batismo do filho. Mas a testemunha pode ser amiga do trabalho. Uma balada de vez em quando, ir no churrasco da firma, isso não é ser amigo íntimo”, avalia Fava.

Como juntar provas

Marcos Fava, do TRT-SP, afirma que os trabalhadores devem “colecionar” no decorrer do trabalho documentos que possam ser úteis futuramente.

“A lei não tem limitação. Em tese, tudo pode ser admitido como prova, desde que obtido de forma lícita. Tudo o que puder colecionar, desde recibo de estacionamento na visita ao cliente, para ficar menor inferiorizado no processo, é válido. Porque geralmente, só quem tem todos os documentos é o empregador.”

O juiz trabalhista Gilber Santos Lima, da 2ª Vara de Vitória (BA) e também vice-presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 5ª Região, na Bahia, completa que provas obtidas sob coação, tortura ou grampo telefônico são desclassificadas. “O que não se admite são as provas ilícitas, todas as outras sim.”

O presidente da Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (Abrat), Luiz Salvador, pondera que cada juiz tem uma posição sobre que provas considera lícitas. “No direito, nunca dá para dizer se é preto ou branco. Tem juiz que acha que é preto, tem juiz que acha que é branco.”

Caso real

Um funcionário de uma multinacional, que preferiu não se identificar porque seu processo está em andamento, contou ao G1 que guardou e-mails que comprovam horário de entrada e saída e documentos que teve de assinar para processar a atuar empresa e pedir rescisão indireta do contrato de trabalho, quando o empregado pede o fim do contrato e recebe todos os direitos dos demitidos sem justa causa.

Ele pede pagamento de hora extra, por ter trabalhado nas férias, e benefícios que outros colegas na mesma função tinham e ele não, como um carro para uso profissional e pessoal que após três anos de uso os funcionários podiam adquirir com desconto.

“Fui juntando as coisas ao longo do tempo, quando percebi que eles estavam agindo errado. Antes de entrar com o processo, tentei conversar com superiores, mas as respostas não foram satisfatórias.”

O funcionário pede ainda danos morais por ter participado de ação considerada por ele como vexatória. Na empresa, os empregados são obrigados a cantar e rebolar. Quem não participa da “brincadeira”, faz isso sozinho, na frente dos demais. Ele disse apresentará como testemunhas dois ex-funcionários da empresa.

O juiz Marcos Fava, do TRT de São Paulo, contou ao G1 que julgou um caso em que uma demonstradora de produtos em supermercados conseguiu gravar pelo celular um episódio de assédio sexual de seu superior imediato. A mulher processou a empresa, que no fim, em razão da gravação, admitiu comportamento inadequado do supervisor e fez um acordo.

Ação coletiva

Presidente da Abrat, Luiz Salvador aconselha que, no caso de irregularidades cometidas pela empresa contra vários trabalhadores, o caminho é procurar o Ministério Público do Trabalho, para uma ação coletiva.

“O procurador pode propor um inquérito e tem condição de pedir quebra de sigilo e requisitar documentos.”

Dificuldades futuras

O advogado e conselheiro da OAB, Eli Alves da Silva, considera que os trabalhadores não devem temer que ao processar uma empresa possam não mais conseguir trabalho.

“O direto de ação é previsto constitucionalmente. Não está fazendo nada de ilícito e mostra determinação em buscar uma reparação.”

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