The Wall Street Journal
David Enrich
O gigante bancário francês Crédit Agricole SA alertou que enfrenta mais de US$ 1 bilhão em novos prejuízos em suas problemáticas operações gregas, num sinal de que a crise financeira europeia ameaça contaminar até os países relativamente saudáveis da região.
Como outros bancos franceses, o Crédit Agricole se aventurou no sul da Europa nos últimos anos, atraído pelo crescimento rápido da região quando a zona do euro se expandia para a periferia do continente. Mas essas apostas fizeram água e os problemas do banco de 116 anos se tornaram simbólicos da crise que também assola outros bancos europeus.
Os problemas são especialmente graves nos bancos franceses. O Crédit Agricole tem uma subsidiária grega que está sob pressão e também detém participação em bancos espanhóis e portugueses. O Société Générale SA tem um banco grego que está no vermelho.
Outro importante banco francês, o BNP Paribas SA, controla um banco português e tem bilhões de euros em dívidas gregas e espanholas, que muitos especialistas consideram em risco de moratória.
O Crédit Agricole divulgou ontem que pode ter que provisionar ? 450 milhões (US$ 554,3 milhões) para cobrir créditos de recebimento duvidoso na Grécia, e deve ter de contabilizar uma baixa de ? 400 milhões no segundo trimestre referente à depreciação de sua combalida subsidiária Emporiki Bank of Greece SA. Esses prejuízos, somados a cerca de ? 2,6 bilhões em perdas no próprio Emporiki, não põem em risco o Crédit Agricole, mas analistas dizem que podem dar uma boa mordida nos lucros de 2010 do banco.
O comunicado derrubou a ação do Crédit Agricole em cerca de 4% e contribuiu para um declínio generalizado de ações de bancos europeus. Desde meados de abril, quando as preocupações com a crise de dívida europeia começaram a aumentar, a ação do banco parisiense já caiu 30%.
A investida do Crédit Agricole fora da França “tem sido nada menos que um desastre”, diz Jaap Meijer, analista da Evolution Securities. A corretora recomenda vender as ações do banco.
No fim do ano passado, o Crédit Agricole e outros bancos franceses tinham uma exposição total de US$ 493 bilhões a Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha, segundo dados divulgados este mês pelo Banco de Compensações Internacionais, mais conhecido pela sigla em inglês BIS. É mais do que qualquer outro país, embora a Alemanha não esteja muito distante, com US$ 465 bilhões.
A Europa “continua vulnerável ao contágio”, diz Jacques Cailloux, economista-chefe de Europa do Royal Bank of Scotland. “A maior exposição é a da França.”
A situação mostra como a interligação do setor financeiro da Europa – antes vista como a maior esperança de crescimento econômico sustentável no continente – se tornou o calcanhar de Aquiles da região. Uma crise financeira originada na Grécia, uma economia insignificante na periferia da Europa, semeia agora dúvidas sobre a saúde do sistema financeiro e econômico da região inteira.
Numa reação à pressão para enfrentar os problemas bancários da região, a União Europeia aceitou semana passada divulgar os resultados dos “testes de estresse” que as autoridades de regulamentação realizariam nos 25 maiores bancos da zona do euro. Os testes têm como objetivo servir de antídoto para a falta de clareza sobre a exposição dos bancos às problemáticas economias do sul da Europa.
Analistas da Nomura International PLC realizaram esta semana simulações de testes de estresse nos 16 maiores bancos europeus. Os três maiores bancos franceses estiveram entre os seis com pior desempenho na capacidade de absorver prejuízos. O Crédit Agricole foi o pior deles e pode ter que levantar mais capital, segundo a Nomura.
O Crédit Agricole passou a maior parte de seus primeiros cem anos de existência concedendo empréstimos a produtores agrícolas empobrecidos e financiando a reconstrução da zona rural da França após a Primeira Guerra.
Seu lema é “Bom senso perto de você”. Em 2006, com a saturação do mercado bancário francês e a expansão das economias de países como a Grécia, o Crédit Agricole embarcou num plano internacional de expansão com foco especial no sul da Europa.
Ele venceu uma disputa para comprar o Emporiki, um deficitário banco estatal grego.
Um executivo do alto escalão do Crédit Agricole disse na época que o acordo refletia “a confiança que temos na economia grega e no crescimento excepcional do setor bancário da Grécia”.
O Crédit Agricole indicou um novo diretor-presidente para o Emporiki, um executivo grego do setor de laticínios chamado Antony Crontiras, sem experiência bancária.
Ele, por sua vez, anunciou logo planos de aumentar o crédito do Emporiki e previa crescimento anual de 30% do lucro.
“O Emporiki vai liderar” o crescimento no resto do sudeste da Europa, disse Crontiras numa entrevista coletiva em abril de 2007 em Atenas. Ele disse que a presença do Emporiki em Chipre, na Albânia e na Romênia iria aumentar de 45 agências na época para 309 até 2011.
A expansão desenfreada deixou o Crédit Agricole vulnerável quando a crise financeira se transformou numa recessão mundial. Desde 2006, o Emporiki perdeu quase ? 1,5 bilhão. Executivos do Crédit Agricole disseram ontem que o Emporiki vai perder cerca de ? 750 milhões este ano e ? 130 milhões em 2011. Em outubro, a empresa previa que o Emporiki perderia cerca de ? 300 milhões em 2010 e atingiria o ponto de equilíbrio em 2011.
Aproximadamente 18% dos créditos do Emporiki são classificados como “deficitários” e executivos do Crédit Agricole disseram ontem que o índice pode subir para 28% ano que vem. As investidas do Emporiki nos Bálcãs e em Chipre também estão dando prejuízo, informou ontem o Crédit Agricole.
O banco “subestimou os problemas e superestimou a capacidade dele de se expandir no mercado grego”, diz Nickolaos Travlos, diretor da Escola de Pós-Graduação em Administração Alba, em Atenas.
“Se você quer que eu diga que o Emporiki foi um ótimo investimento, não vou falar isso”, disse ontem o diretor financeiro do Crédit Agricole, Bertrand Badre, numa teleconferência de quase duas horas com analistas. Ele disse esperar que o Emporiki saia do vermelho em 2012.
Mas os executivos também disseram ontem que o Emporiki responde por apenas 3% do total de agências e do faturamento da matriz e, por isso, seus problemas não ameaçam a integridade do Crédit Agricole. “Gostaríamos de nos assegurar de que a situação na Grécia não prejudique a visão geral que temos do futuro de nosso grupo”, disse Bruno de Laage, diretor-geral adjunto do banco.
Ao mesmo tempo, os executivos se recusaram a descrever quais são suas vulnerabilidades nos outros países problemáticos no sul da Europa.