Valor Econômico
Fernando Travaglini, de São Paulo
As novas regras para os fundos de pensão devem mexer com as emissões de dívida das empresas. A Resolução 3792, do Conselho Monetário Nacional (CMN), atendeu uma demanda do mercado ao permitir que as fundações comprem ativos nas chamadas ofertas com esforço restrito, forma de captação de recursos criada no início do ano para desburocratizar o acesso ao mercado de capitais ao reduzir prazos e custos das operações para lançamento de títulos como as debêntures.
Esse tipo de oferta segue a Instrução 476, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), e serve para empresas que necessitam de uma operação mais ágil, como no caso dos empréstimos-ponte, em que a companhia toma recursos mais rapidamente enquanto aguarda um financiamento de mais longo prazo. A agilidade se deve à dispensa do registro da operação na CVM.
A única limitação era a não participação dos fundos de pensão, pois a antiga regra do setor de previdência complementar definia que as fundações só poderiam participar de ofertas que tivessem sido registradas na CVM. Já a nova resolução diz que os títulos devem apenas “observar as normas estabelecidas pelo BC e pela CVM”, desde que as empresas sejam de capital de aberto.
Essa mudança na norma, diz Marina Procknor, sócia do escritório Mattos Filho, permite que as entidades de previdência complementar também participem de uma oferta com esforço restrito. Segundo ela, muitas companhias deixavam de usar essa opção mais rápida por não poder contar com a participação dos fundos de pensão.
Estima-se que cerca de 80% das operações de oferta pública atinjam somente 20 investidores, que é justamente o limite máximo para se fazer uma oferta restrita. Mas as empresas eram obrigadas a registrar a oferta justamente para poder contar com a participação das fundações.
Segundo Alberto Kiraly, vice-presidente da Anbid, essa mudança dever ter um “impacto importante” no mercado pelo tamanho dos investimentos feitos pelas fundações. “Isso abre um bom potencial de crescimento”.
Muitas empresas como TAM, CPFL, a construtora MRV, o grupo Pão de Açúcar e a Camargo Corrêa já testaram o novo tipo de emissão. Kiraly disse ainda que as ofertas restritas vêm sendo bem aceitas também pelos investidores. Até agosto, R$ 11,8 bilhões haviam sido captados usando a nova regra, em emissões de debêntures, notas promissórias e certificados imobiliários. O valor representa mais de um terço do total.
Rubens Vidigal Neto, do escritório Levy & Salomão Advogados, afirma que as operações com esforço restrito vinham sendo usadas somente para ofertas direcionadas, quando já se conhecida o investidor. “Para ofertas que se quer de fato acessar o mercado, utiliza-se o processo antigo de oferta pública, que toma 50 dias apenas para se conseguir o registro na CVM. Agora, já percebemos a movimentação de bancos de investimento e das empresas para iniciar ofertas com esforço restrito que realmente sejam públicas”, disse.
Os fundos de pensão ponderam que qualquer mudança requer estudo e aprovações dos comitês de investimentos e isso demanda tempo. Num primeiro momento, fundos ouvidos pelo Valor relatam que a participação em oferta restrita ainda não está no radar de aplicação.
De toda forma, essa deve ser a medida com maior impacto no curto prazo. Além dessa novidade, a nova resolução também ampliou a possibilidade de alocação em ativos de maior risco, de forma a permitir que as entidades possam ampliar seus retornos em um cenário de menor taxa de juros.
Para isso, o limite para aplicação em ações subiu de 50% para 70%. Considerando que alguns investimentos foram retirados da categoria de renda variável, como alocação em fundos de “private equity” (fundos de participação), esse percentual pode ser ainda maior.
“Essa resolução já é algo no sentido de dar mais espaço para as fundações. Ao mesmo tempo, existe uma preocupação em ampliaram a necessidade de certificações dos gestores para saber se eles estão habilitados para comandar esse movimento”, disse Cesar Soares Barbosa, diretor da Sabesprev.
A nova regra, no entanto, serve para poucos fundos, como a Previ, por exemplo, que estava desenquadrada. Segundo estimativa da consultoria RiskOffice, sem considerar o fundo dos funcionários do Banco do Brasil, a alocação em renda variável média do sistema cai de 30% para menos de 15% dos mais de R$ 450 bilhões em ativos.
Mas como tudo no mundo das fundações, os movimentos serão lentos, disse Jorge Simino, diretor da Fundação Cesp. Os fundos terão de ampliar os riscos para conseguir retornos maiores em um cenário de juros menores, mas a dinâmica de investimentos das entidades é lenta e respeita uma série de procedimentos que leva tempo para realizar mudanças.