O Jornal do Comércio, de Porto Alegre, publicou na segunda-feria, dia 28, uma entrevista com o presidente da Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ), Sérgio Rosa. Além de um balanço do ano, ele aborda as negociações com a Vale e seu impacto político, as medidas adotadas para enfrentar e superar a recente crise mundial, com a demissão de funcionários, que o executivo admite que talvez tenham sido precipitadas. Rosa afirma que a Previ deverá fechar o ano com um patrimônio da ordem de R$ 135 bilhões.
Confira a íntegra da entrevista:
Previ deve fechar o ano com patrimônio de R$ 135 bilhões
O patrimônio do maior fundo de pensão do Pais, o Previ – Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil, chega ao fim de 2009 na casa de R$ 135 bilhões depois de bater R$140 bilhões no fim de 2007 e cair para R$ 117 bilhões sob os efeitos da crise.
Uma recuperação surpreendente para um ano igualmente surpreendente, na opinião do presidente do fundo, Sérgio Rosa. O executivo comentou os fatos que marcaram o ano de 2009. Também falou sobre a polêmica envolvendo a proposta de compra de parte do bloco de controle da Vale pelo empresário Eike Batista.
Como foi o ano de 2009 para a Previ?
Sérgio Rosa – Sinceramente, no início do ano nos preparamos para o pior, sobretudo em termos de buscar liquidez para pagar os benefícios. Temos obrigação no Plano 1 de pagar algo em torno de R$ 6 bilhões de benefícios por ano. Tínhamos um dilema sobre quais ações e quando vender para pagar esses benefícios. Tivemos de lidar um pouco com um cenário de estresse.
Chegaram a vender ações em baixa?
Rosa – Vendemos. Não podíamos deixar para vender tudo no final do ano. Comercializamos um volume razoavelmente pequeno. Logicamente, depois, quando o mercado voltou a se recuperar, reorganizamos isso. Mas, no primeiro semestre, fizemos algumas vendas de ações selecionadas para dar conta do pagamento de benefícios.
Quanto foi vendido no primeiro semestre?
Rosa – Cerca de R$ 1 bilhão. O total do orçamento deste ano era vender R$ 3 bilhões. Vendemos os outros R$ 2 bilhões em condições de mercado melhores. Precisamos fazer isso. No plano 1 não temos mais contribuição, então, não entra dinheiro novo aqui, só o rendimento, o dividendo, que tem dado uma média de R$ 2,4 bilhões. Recebemos mais R$ 500 milhões de aluguéis por ano.
No ano passado, nosso patrimônio foi de R$ 117 bilhões. Chegou a mais de R$ 140 bilhões no final de 2007. Entre 2000 e 2008 pagamos quase R$ 12 bilhões de benefícios. Então, voltar ao mesmo patamar ou quase ao mesmo patamar é fantástico.
O governo ampliou o limite geral de exposição em bolsa de 50% para 70% do patrimônio. A Previ está totalmente enquadrada?
Rosa – Não. Há desenquadramentos pontuais, como o da Vale, onde temos mais de 10% do nosso patrimônio aplicados na empresa. O enquadramento, nesse caso, é mais complicado. É um ativo muito rentável, uma empresa de baixo risco, e a gente não imagina sair da posição toda da Vale, a não ser por uma oferta muito vantajosa.
O empresário Eike Batista chegou em algum momento a fazer uma oferta pela Vale?
Rosa – Não, em nenhum momento ele fez uma oferta objetiva. Ele esteve aqui, conversou sobre as intenções gerais, indicou que estaria buscando alguma negociação com a Bradespar, mas em nenhum momento fez oferta pela participação da Previ.
Pareceu que já estava certa a compra, ou da participação da Bradespar ou da Previ.
Rosa – As matérias que saíram nos jornais deram esse indicativo, mas eu já falei várias vezes que não.
Ele falou da intenção de te colocar na presidência da Vale?
Rosa – Não, de jeito nenhum.
Não seria difícil um presidente da Previ sair para presidir uma empresa como essa, seria?
Rosa – Não sei. Não posso falar sobre esse assunto.
Quando a Previ entrou na Vale, qual era a relação com o patrimônio?
Rosa – Ela representava 2,5% do patrimônio. Em quatro momentos diferentes a gente acompanhou operações internas da Vale e elevou a participação.
A não ser que o patrimônio da Previ cresça extraordinariamente, a Previ terá mesmo de vender uma parte?
Rosa – Em algum momento, sim.
Como seria uma operação dessas? Em quanto tempo isso é decidido?
Rosa – Não tem prazo para uma decisão dessas ser tomada. Ela fica à espera de uma oportunidade certa. Embora exista um prazo, mesmo o.limite de 2014 está sujeito a se ter, nesse intervalo de tempo, uma boa oferta. Enquanto gestores, temos de atender às questões legais, mas também às questões de economicidade, de razoabilidade das coisas. Se eu tivesse necessidade de vender para pagar benefícios, tudo bem. Mas tenho outros ativos para vender. Posso lidar com o tempo e aguardar uma oferta e uma condição adequada de venda.
Esse prazo de 2014 pode ser estendido?
Rosa – Sempre existe (a possibilidade). Aí funciona a lógica do explicar e demonstrar que situação se tem. Pode até haver mudança na legislação, o legislador pode estar sensível a entender a situação específica. Temos um superávit muito significativo no Plano 1, então o risco de estar desenquadrado fica mitigado por essa situação de superávit. Temos uma exposição maior num ativo, mas também temos folga maior no plano.
As mudanças na legislação vêm ocorrendo. Nessa nova norma, por exemplo, já há uma previsão de que o desenquadramento, se for correspondente ao superávit, pode ser carregado por mais tempo. Vem ocorrendo uma mudança paulatina. Temos bastante flexibilidade para aguardar o momento ideal.
Como o senhor avalia o cenário para 2010 e o que espera do próximo ano?
Rosa – As coisas foram muito surpreendentes nesse período 2008/2009. A capacidade de fazer projeções é muito limitada.Na economia brasileira, eu acho que existem inúmeros fatores apontando para um cenário positivo, defendendo a ideia de que a gente possa crescer 5% ou mais (em 2010). Uma coisa vem se sustentando, que é o aumento da renda dos trabalhadores, com criação de emprego e aumento da renda média. Mesmo neste ano vamos ter a criação de 1,3 milhão de empregos formais. Isso é uma coisa fenomenal.
A Vale acabou sendo criticada por demitir no auge da crise. As demissões foram votadas no conselho?
Rosa – Demissão não é votada no conselho. Tivemos conhecimento, mas não é uma questão votada. Essa é até uma questão de menos importância. Formalmente, toda a gestão de pessoas tem diretrizes gerais aprovadas no conselho. Mas a execução, quem contrata, quem demite, quem negocia acordos salariais é a diretoria executiva. Óbvio, que o conselho compartilha, na forma de comunicados, de uma visão geral das coisas.
Pode-se dizer que foi precipitada a demissão dos funcionários?
Rosa – Talvez tenha sido. Mas acho que isso ficou para trás. Foi uma crise de dimensões bastante significativas, sobretudo no nível mundial. Todo mundo reagiu sob impacto disso, sob impacto da incerteza, de uma crise desconhecida no período recente. A eficácia dos planos de recuperação adotados pelos governos era de uma incerteza enorme. Ou seja, ninguém tinha certeza se os planos iam funcionar, quanto mais de dinheiro seria necessário injetar na economia.
O corte de investimentos também não é votado pelo conselho?
Rosa – O corte de investimentos, sim. Faz parte do orçamento, do plano estratégico, tudo isso é matéria de aprovação no conselho. A Vale hoje retornou a planejar investimento recorde para os próximos anos. Ela já voltou a vender praticamente toda a capacidade de produção dela. Aconteceu uma situação na China que também foi inusitada. Primeiramente, a China jogou lá para baixo a demanda por minério de ferro, consumiu todo o estoque que tinha.
Como se vai ter certeza do estoque interno da China? Não se tem informação aberta sobre essas coisas. Eles começaram a jogar pesado, pedindo descontos de 60% no preço do minério. O jogo foi pesado. Eles suspenderam pedidos de minério, só compravam no mercado spot. As autoridades chinesas, que falam em nome da siderurgia, começaram a colocar uma grande pressão para reduzir o preço do minério.