Mudanças do BC abrem folga de R$ 12,7 bilhões de capital para bancos

Carolina Mandl e Fabiana Lopes
Valor Econômico | De São Paulo

Insuficiente para reanimar o crédito, uma série de medidas macroeconômicas tomadas pelo Banco Central (BC) desde julho serviu para trazer um maior conforto de capital para os cinco maiores bancos do país.

Levantamento feito pelo Valor mostra que, juntos, Banco do Brasil (BB), Itaú Unibanco, Caixa Econômica Federal, Bradesco e Santander ganharam uma folga de R$ 12,7 bilhões de junho para setembro deste ano. Quase 80% disso beneficiou os bancos públicos. As medidas reduziram o chamado patrimônio de referência, o volume mínimo de capital que o BC exige que cada banco tenha para suportar as operações de crédito.

O efeito prático disso é que todos os bancos encerraram setembro com um índice de Basileia mais robusto do que aquele exibido em junho. Em um trimestre, as instituições ganharam de 0,5 ponto percentual – caso do Bradesco – a 2,05 pontos percentuais – situação da Caixa.

A recalibragem promovida pelo BC não foi o único fator que levou ao incremento da folga de capital, mas os bancos afirmam em relatórios que essa alteração teve um papel fundamental.

Em julho, e depois novamente em agosto, o BC reduziu a exigência de capital para operações de crédito consignado e pessoal, financiamento de veículos e empréstimos a empresas de pequeno porte. O maior corte se deu no empréstimo com desconto direto na folha de pagamento. Antes, a autoridade considerava que cada R$ 100 desembolsados de crédito consignado representavam um risco para o banco de R$ 75 a até R$ 150. Agora, depois da revisão feita pelo BC que considerou o débito direto no salário uma forte garantia, esse crédito é contabilizado a R$ 50 para efeito do cálculo do capital exigido.

Donos das maiores carteiras de crédito consignado do país, BB e Caixa acabaram sendo os maiores beneficiados pelas mudanças. O índice de Basileia do Banco do Brasil encerrou setembro em 16,04%, maior indicador pelo menos desde 2010. Em junho, o índice era quase dois pontos percentuais menor. A maior contribuição para esse incremento veio das medidas do BC. Isoladamente, elas tiveram um impacto para o indicador de 1,06 ponto percentual. O maior banco público do país teve uma folga de R$ 6,6 bilhões no patrimônio mínimo exigido.

Na Caixa, o índice de Basileia em setembro foi de 15,3%, superior em dois pontos percentuais ante junho. Segundo o superintendente nacional de administração de risco corporativo da Caixa, Dermeval Bicalho Carvalho, o principal efeito dessa expansão veio das mudanças dos fatores de ponderação de risco, que contribuíram com 1,02 ponto percentual.

“O impacto está ligado ao perfil da carteira de cada banco. Não é pelo fato de ser banco público ou privado. O grande beneficiário [da medida] é o consignado”, diz Carvalho. O conforto recebido pela Caixa depois das medidas foi de R$ 3,4 bilhões.

No período, tanto Caixa quanto BB também transformaram alguns títulos de dívida em papéis com peso de capital principal de acordo com as regras de Basileia 3, ação que contribuiu para a subida do índice.

Entre os bancos privados, a instituição que mais se beneficiou das mudanças feitas pelo BC foi o Santander, que ganhou um espaço de R $ 1,9 bilhão. O banco credita esse impacto ao alívio dado pelo BC às operações de financiamento de veículos, crédito consignado, crédito pessoal e fianças prestadas. Algumas mudanças na exposição de risco de mercado também reduziram a demanda de recursos.

O Bradesco apresentou no balanço do terceiro trimestre uma folga de R$ 847 milhões. O índice de Basileia da instituição teve um incremento de 0,5 ponto percentual no trimestre e passou de 15,8% em junho para 16,3%.

O único banco que não ganhou com a recalibragem foi o Itaú Unibanco, cujo patrimônio de referência mínimo exigido cresceu em R$ 224 milhões. O aumento de 0,6 ponto percentual no índice de Basileia, para 16,6%, se deveu principalmente à incorporação de lucros. O maior banco privado do país diz, porém, que a quase estabilidade dos ativos ponderados pelo risco também contribuiu.

Em pouco mais de um ano, o Banco Central já fez três alterações no cálculo dos ativos ponderados pelo risco. Essas mudanças colaboram para aumentar o capital dos bancos, fazendo com que as instituições cumpram mais facilmente as regras de Basileia 3. Iniciada em outubro do ano passado, a implementação das novas regras será gradual até 2019.

A primeira rodada de recalibragem feita pelo BC veio em março de 2013, ainda antes da implementação de Basileia 3. Em outubro do ano passado, quando as regras mais rígidas de exigência de capital entraram em vigor, os bancos já ingressaram nas novas normas com um alívio extra.

Além de buscar o estímulo ao crédito, as medidas do BC tiveram como objetivo aproximar mais a exigência de capital no Brasil ao padrão internacional, uma antiga demanda dos bancos brasileiros. Segundo o Valor apurou, o BC não pretende voltar a apertar a exigência de capital. “Enquanto esse crescimento adequado do crédito permanecer, não imaginamos a volta do fator de ponderação mais alto”, diz uma fonte ligada ao governo.

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