Folha: Lula critica empresários que demitem

FOLHA DE SÃO PAULO
SIMONE IGLESIAS
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandou ontem um recado claro aos empresários: o governo não irá se engajar na flexibilização das relações de trabalho, não aceita pagar seguro-desemprego durante suspensão temporária de contrato de trabalho e não vê motivo para demissões neste momento.

Em reunião com Lula na semana passada, os presidentes da Vale, Roger Agnelli, e da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Armando Monteiro Neto, defenderam mudanças na legislação para permitir a suspensão de salários por dez meses, período em que o empregado receberia só seguro-desemprego, pago pelo governo, e manteria o vínculo empregatício.

Grandes empresas como Vale e CSN já anunciaram demissões nas últimas semanas, com o agravamento da crise, e muitas outras deram férias coletivas.

“Eu acho que é muito engraçado. Os empresários poderiam pagar [os funcionários] com parte dos lucros que acumularam. O governo não vai deixar de assumir a responsabilidade de cuidar dos trabalhadores, mas nenhum empresário tem motivo para mandar trabalhador embora”, disse Lula.

E acrescentou: “É só analisar os números do comércio, é só ver como está o final de ano, o que aconteceu na feira do automóvel no fim de semana passado. O papel do empresário agora não é ficar encontrando um jeito de continuar mantendo o mesmo lucro, mas trabalhar de forma muito rápida junto com o governo para que a gente evite que a crise chegue a toda a sociedade”, afirmou.

Lula disse que está “pronto” para se envolver nas negociações, mas como forma de auxiliar o lado mais fraco: “Se em alguma situação os trabalhadores quiserem a participação ou a intermediação do governo, estaremos prontos”, afirmou, mas insistiu em dizer que o “problema” é de trabalhadores e empresários, não do governo.

“Eu não sei de onde saiu essa notícia [que o governo vai propor a flexibilização da legislação trabalhista]. De vez em quando alguém cria uma coisa e passa a ter o tom de verdade. Não fiquem esperando que o governo faça tudo. O governo vai fazer de tudo para evitar que a crise não atinja o mercado de trabalho. Agora, se por qualquer circunstância uma empresa tiver em crise, essa empresa e o sindicato se coloquem de acordo e, com muita maturidade, evitem que os trabalhadores sejam penalizados”, afirmou.

Depois de descartar o pedido dos empresários por mais flexibilidade nas relações de trabalho, Lula defendeu que o governo americano adote medidas para impulsionar a economia real e recomendou a adoção do Bolsa Família pelos EUA.

“Até agora a única coisa que eu sei é que eles [EUA] estão colocando dinheiro para salvar banco. Se esse dinheiro fosse colocado para a indústria, agricultura, para os pobres, criasse Bolsa Família, certamente não teríamos a crise se aprofundando”, disse Lula, em entrevista ao lado do dirigente cubano, Raúl Castro.

Reação

Monteiro Neto, da CNI, afirmou que o debate sobre a flexibilização dos direitos trabalhistas deve se manter na agenda do país independentemente do apoio do governo. “Nunca pedimos tutela do governo. Isso precisa ser discutido entre empresários e trabalhadores. A flexibilização é uma questão que se impõe pela situação atual, porque, obviamente, não interessa a ninguém demitir.”

Ele admite que, com o apoio do governo, a questão ganharia maior significado. Para Monteiro, porém, ainda há espaço na legislação para negociar formas de flexibilidade com o sentido de garantir empregos.

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