O Estado de São Paulo
Andrei Netto, PARIS
Na véspera da abertura do G-20, em Pittsburgh, a União Europeia anunciou, em Bruxelas, uma reforma integral dos instrumentos de supervisão do mercado financeiro válidos para os 27 países. A partir de 2010, um Comitê Europeu de Risco Sistêmico (Cers) será criado para acompanhar a evolução das operações e a saúde financeira das instituições, com base em informações de novas autoridades de supervisão. O projeto, apoiado por França, Alemanha e Reino Unido, independe das decisões do G-20. Os demais países acompanharão o sistema se quiserem.
A decisão unilateral foi apresentada ontem pela Comissão Europeia, o braço executivo do bloco, e ainda depende da chancela do Parlamento Europeu. A proposta vinha sendo discutida desde outubro pelos líderes dos 27 países e tinha no presidente da França, Nicolas Sarkozy, o maior defensor. Baseado nas propostas de Jacques de Larosière, ex-presidente do Banco da França – o Banco Central do país -, entre 1987 e 1993, o projeto visa a reforçar a segurança do sistema, criar regras comuns para todos os países do bloco e, como consequência, permitir a ação conjunta dos governos em momentos de crise.
Para tanto, são adotadas reformas micro e macroprudenciais. A mais importante é a criação de uma espécie de “polícia financeira”, o Cers, órgão ao qual caberá detectar os riscos sobre o sistema e emitir alertas, advertências e recomendações. Seu papel será político, já que não terá poder de intervir em instituições financeiras privadas. Seu conselho será formado pelo presidente do Banco Central Europeu (BCE), pelos presidentes de bancos centrais nacionais e pelo presidente do também recém-criado Sistema Europeu de Supervisão Financeira (Sesf).
Na prática, o Sesf será uma rede formada pelas autoridades financeiras nacionais dos 27 países-membros, pelos diretores de mais três novos órgãos: a Autoridade de Bancos Europeus (ABE), a Autoridade Europeia de Seguros e Pensões Profissionais (AEAPP) e a Autoridade Europeia de Mercados Financeiros (AEMF). À última caberá também fiscalizar as agências de classificação de risco.
Junto com as novas instituições, a Europa aplicará novas normas técnicas e contábeis, que vêm sendo definidas desde outubro de 2008, durante as reuniões do Conselho Europeu – o órgão que reúne os 27 chefes de Estado e de governo.
“A crise financeira trouxe à luz as fraquezas no dispositivo de supervisão financeira da União Europeia, que continua fragmentada de acordo com os esquemas nacionais, apesar da importância das instituições europeias e do fato de que o mercado único foi criado há mais de dez anos”, afirma o relatório da Comissão Europeia. “Nosso objetivo é proteger os contribuintes europeus do ocorrido no ano passado, quando os governos tiveram de injetar bilhões de euros nos bancos”, argumentou José Manuel Durão Barroso, presidente da comissão.
Com a publicação da reforma um dia antes da abertura oficial do G-20, o objetivo da União Europeia é pressionar a cúpula, deixando transparecer que os demais países terão de segui-la. “Às vezes criticam a Comissão por sermos lentos nas respostas, mas hoje nós somos os primeiros”, disse o comissário Europeu de Assuntos Econômicos, Joaquin Almunia. “Este sistema europeu poderá também inspirar um sistema mundial. É a proposta que defenderemos no G-20, em Pittsburgh.”
Sarkozy, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e o primeiro-ministro do Reino Unido, Gordon Brown, negociaram até o último instante os detalhes da proposta. Brown insistiu e obteve a garantia de que as novas autoridades terão apenas poder político, e não capacidade de intervenção nos países. Assim, os órgãos de supervisão não terão ingerência sobre a soberania orçamentária dos países.N