Adriana Aguiar
Valor Econômico
O número de autuações por irregularidades no controle da jornada de trabalho de empregados tem crescido ano a ano em cidades da Grande São Paulo e Baixada Santista. Entre 2011 e 2012, praticamente dobrou com a exigência do novo relógio eletrônico.
No ano passado, de acordo com levantamento do Ministério Público do Trabalho em São Paulo (MPT-SP), feito a pedido do jornal Valor Econômico, foram expedidas 318 multas contra empresas nos municípios de São Paulo, Guarulhos, Mogi das Cruzes, Osasco, Santos e São Bernardo do Campo. Em 2011, 171. Só neste ano, já foram registradas 143 autuações até o fim de junho.
A implantação do novo relógio de ponto eletrônico foi determinada pela Portaria nº 1.510, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que, depois de vários adiamentos, entrou em vigor no ano passado, de forma progressiva. Hoje, há 47.282 equipamentos cadastrados no MTE, utilizados por 22.246 empresas em todo o país.
Além da falta do novo ponto eletrônico, as empresas têm sido multadas por fraudes no controle de jornada, controles alternativos do horário de entrada e saída do trabalhador e exigência de horas extras além dos limites legais.
De acordo com a procuradora Mariana Flesch Fortes, do Ministério Público do Trabalho em São Paulo, nessas autuações estão todas as situações irregulares que tratam de “anotação e controle da jornada”. Na maioria dos casos, afirma, os procuradores apuram denúncias apresentadas pelos próprios trabalhadores ou familiares na página da internet do MPT-SP. “Como envolvem, em geral, toda a empresa, essas denúncias são encaminhadas aos procuradores, que dão prioridade às ações coletivas”, diz a procuradora.
O MPT-SP, segundo Mariana, fez diversas campanhas, até mesmo no metrô de São Paulo, para torná-lo mais acessível à população, o que pode ter gerado mais reclamações sobre irregularidades nas empresas. “Havia uma demanda reprimida e essas campanhas podem ter desencadeado novas denúncias”, afirma a procuradora.
A maior parte das reclamações trata de fraude na anotação dos horários de entrada e saída dos funcionários, segundo Mariana. “São empresas que obrigam os trabalhadores a anotar uma jornada diferente da que se pratica. Como pedir para o funcionário bater cartão e continuar trabalhando. Há companhias que não contabilizam, por exemplo, a jornada de trabalho realizada na folga semanal.”
Também existem, de acordo com a procuradora, muitas denúncias contra empresas que já entregam um controle de ponto com os horários de entrada e saída de todos os dias do mês para o empregado assinar de uma vez só. E em número menor, há casos de companhias que adotaram métodos alternativos de controle de jornada, como anotar somente os dias em que o empregado faltou, cumpriu horas extras ou saiu mais cedo.
Segundo o advogado Marcelo Ricardo Grünwald, do escritório Grünwald e Giraudeau Advogados Associados, a maioria das empresas que assessora já se adaptou ao ponto eletrônico. Mas algumas, que resolveram optar por um método alternativo, conhecido como regime de exceção – na qual só se registra em casos excepcionais, quando há horas extras, faltas ou atrasos -, sofreram investigações, mesmo que tenha sido firmado por meio de acordo em convenção coletiva, como prevê a Portaria n º 373, de fevereiro de 2011, do Ministério do Trabalho e Emprego. Por isso, ele tem recomendado que essas empresas passem a adotar o método tradicional de controle de jornada.
Outro fator que pode ter contribuído para o aumento das autuações é o fato de muitas empresas exigirem horas extras além dos limites legais. Para o advogado trabalhista e professor Túlio de Oliveira Massoni, do escritório Amauri Mascaro Nascimento & Sônia Mascaro Advogados “a prorrogação da jornada de trabalho deve ser algo excepcional, para tratar de serviços inadiáveis e imprevistos”.
Segundo Massoni, se a hora extra é cotidiana e sem o pagamento do adicional, é considerada como ilícito, de acordo com as normas trabalhistas. ” A prorrogação habitual da jornada tem gerado autuações contra as empresas, além de ações civis públicas e termos de ajustamento de conduta (TACs) para coibir o abuso”, diz.
Para o advogado Fábio Medeiros, do escritório Machado Associados, as autuações aplicadas pelo Ministério Público do Trabalho têm sido mais eficazes para coibir práticas trabalhistas consideradas ilícitas do que as multas aplicadas pelos fiscais do trabalho, ligados ao Ministério do Trabalho. Isso porque essas multas aplicadas pelos fiscais são, em geral, de valores muito baixos. Já no caso do MPT, as multas previstas em termos de ajustamento de conduta ou em ações civis públicas podem ser bem mais altas. “As empresas acabam sentindo no bolso”, afirma.
Contexto
A legislação trabalhista brasileira determina que toda empresa com mais de dez funcionários deve optar por uma das três modalidades para o controle da jornada de trabalho: ponto manual (escrito), mecânico (cartão) ou eletrônico.
As companhias que decidiram registrar a jornada de seus trabalhadores de forma eletrônica, porém, tiveram que adotar um novo aparelho, seguindo as regras da Portaria nº 1.510, de agosto de 2009, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que começou a valer no ano passado. O novo relógio deve emitir comprovantes em papel nas entradas e saídas dos trabalhadores, que podem servir de prova em futuras ações judiciais.
O equipamento, que precisa ser homologado pelo MTE, contém uma espécie de “caixa preta” para o registro de toda a movimentação de empregados, sem que isso possa – pelo menos em tese – ser alterado pelo empregador.
Também deve ter uma entrada USB para que o fiscal do trabalho tenha acesso às informações. As mudanças levaram empresas e entidades de classe ao Judiciário e fez com que o Ministério do Trabalho adiasse diversas vezes a vigência da obrigação.