Valor Econômico
Adriana Cotias, de São Paulo
A malha é extensa. São mais de 150 mil correspondentes bancários no Brasil, número muito acima das 19 mil agências convencionais. Apesar disso, essa via, que desde a origem chega às regiões mais afastadas e atende às populações carentes, ainda tem um longo caminho a trilhar para extrapolar o mero pagamento de benefícios e recebimento de contas e tornar-se um meio efetivo de inclusão financeira. Dos mais de 1,6 bilhão de transações realizadas pelo canal anualmente, 60% referem-se à autenticação de boletos, percentual que já foi de 80%, mas que vem caindo devagar.
O diagnóstico é do Centro de Estudos em Microfinanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que, com o apoio do International Development Centre, ligado ao governo canadense, e do Banco Mundial, vem mapeando, desde meados da década, as iniciativas de microfinanças no país, associadas à evolução da tecnologia bancária.
“Os correspondentes no Brasil são vistos no mundo todo como referência em inovação, têm grande relevância ao levar o atendimento bancário aos mais pobres, têm um papel transformador em certas economias, mas toda a infraestrutura instalada, com custos fixos incorrendo, está sendo subutilizada”, diz o professor Lauro Gonzales, coordenador da área na FGV. A crítica é que estabelecimentos como farmácias, mercearias e lotéricas, que têm a atividade de correspondente como extensão do próprio negócio, distribuem de forma limitada microcrédito e microsseguros e praticamente não captam poupança.
A grande massa atendida pelos correspondentes tem baixa cultura financeira e usa o caixa do comércio para receber benefícios de aposentadoria e programas sociais, eventualmente abrindo contas simplificadas, diz Eduardo Diniz, um dos pesquisadores da FGV . “O cliente acaba abrindo conta e ela não serve para nada. Está bancarizado, mas o efeito disso é nulo, não há outros serviços embutidos.” Ele conta que quando as instituições cadastram um correspondente no Banco Central (BC) costumam pedir habilitação para vários serviços, mas que a prática mostra o maior peso de saques e pagamentos, transações sem riscos.
Pelos dados do BC, em 2009 o saldo das carteiras de microcrédito (consumo, produtivo e consignado) esbarrava no R$ 1,8 bilhão, uma fatia irrisória do crédito total no país – R$ 1,4 trilhão.
Os correspondentes são a via que poderia diminuir essa distância, como já mostraram as grandes redes de varejo, que passaram a atuar no financiamento ao consumo e se especializar em dar crédito aos mais pobres muito antes dos bancos. Gonzales lembra do caso do Banco ibi, que nasceu dentro da rede C&A. Quando adquirido pelo Bradesco, em 2009, 40% dos 11 milhões de clientes titulares de cartões não tinham conta em banco.
Em todo o país, de 2004 para cá, 10 milhões de contas simplificadas foram abertas pelos bancos. Mas, ao fim de 2009, apenas 5,7 milhões delas estavam ativas. Ou seja, quase metade simplesmente ficou esquecida pelos clientes. As contas de poupança ativas limitavam-se a 16,8 mil. Já o número de clientes que efetivamente têm operações de microcrédito não passa de 800 mil, calcula Diniz.
Para os pesquisadores da FGV, falta aos bancos beber na fonte do microcrédito produtivo, que coloca em campo agentes de crédito para entender as necessidades dos microempreendedores. Os comerciantes que atuam como correspondentes poderiam exercer papel semelhante para os bancos.
Diniz ainda cita o formato do Lemon Bank, que antes de fechar as portas e passar sua rede de correspondentes para o Banco do Brasil, em 2009, provou ser possível distribuir produtos financeiros para a baixa renda sem ter agências físicas e até ensaiou a criação de um cadastro positivo, a partir da autenticação de boletos. Em sete anos, conquistou 5 milhões de clientes. A pouca experiência no crédito foi, porém, um dos fatores apontados para seu fim precoce.