Bancos facilitam crédito no caixa eletrônico, mas escondem armadilhas

Exibida com destaque na tela inicial dos caixas eletrônicos ou em momentos estratégicos, como quando o cliente vai pagar a fatura do cartão, a oferta de crédito de acesso rápido e fácil é considerada por órgãos de proteção ao consumidor uma das armadilhas que levam ao superendividamento.

Pesquisa feita pelo GLOBO em terminais de autoatendimento dos seis maiores bancos que atuam no país (Banco do Brasil, Bradesco, Caixa, HSBC, Itaú e Santander) mostra que é possível contratar empréstimo pessoal em valores que podem ultrapassar os R$ 40 mil em poucos cliques e sem ser informado sobre os juros. Para os órgãos de defesa do consumidor, a atuação dos bancos é abusiva.

– Em tempos de educação financeira e de combate ao superendividamento, induzir o consumidor a contratar empréstimo sem prestar as devidas informações, sem ajudá-lo a avaliar se o financiamento é mesmo necessário e dando destaque a essa opção dentre as demais no menu do caixa eletrônico é uma irresponsabilidade. Desaconselhamos este meio de acesso. O ideal é ir ao banco conversar com o gerente e negociar taxas de juros mais baixas – alerta a economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim.

Pesquisas realizadas pelo instituto sobre o serviço mostram que a maioria dos bancos omite as taxas de juros durante a contratação e os demais encargos que incidem sobre a operação. Também não fica claro se o consumidor está simulando a contratação ou já oficializando o empréstimo. O que, segundo Ione, pode levar o cliente a contratar um financiamento involuntariamente.

Neste caso, o consumidor tem sete dias para cancelar o empréstimo, conforme determina o Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao estabelecer o direito ao arrependimento. O problema, alerta a coordenadora institucional da Proteste – Associação de Consumidores, Maria Inês Dolci, é que os bancos dificultam o cancelamento.

– Para contratar o empréstimo, você pode ir a qualquer caixa eletrônico. Agora, para cancelar, os bancos exigem que você vá até a agência na qual tem conta. E, quando o cliente chega, é convencido a continuar com o financiamento – relata Maria Inês, recordando o resultado de pesquisa realizada pela entidade há menos de dois anos.

DEFENSORIA NOTIFICOU OS MAIORES BANCOS

O comerciário Oswaldo Neves tem conta no Santander e no HSBC e reclama que, em ambos, a primeira opção na tela do caixa eletrônico é a de oferta de crédito. E conta que quase caiu na “armadilha”:

– Fiquei um pouco confuso no caixa, quando apareceu a foto de um pai com o filho no colo, não entendi que era uma oferta de empréstimo e quase cliquei no lugar errado. Creio que teria como reverter , mas ainda assim é um engodo. Ali você não tem a possibilidade de fazer perguntas sobre custo efetivo total, taxas, forma de pagamento, vencimento – argumenta Neves.

A questão levantada pelo comerciário é apontada por especialistas como outro problema do autoatendimento: as opções de parcelamento são pré-determinadas, com destaque ao parcelamento mais extenso e juros maiores.

– Cuidado com os empréstimos que têm como atrativo o pagamento da primeira parcela após dois ou três meses. Além do juro remuneratório será acrescido o juro de acerto, para compensar a postergação do pagamento. Isso faz o custo total do crédito se tornar maior – alerta Ione.

Larissa Davidovich, coordenadora do Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon) da Defensoria Pública do Estado do Rio, classifica a prática como “abusiva, agressiva e irresponsável”:

– Os bancos não perguntam se o cliente quer empréstimo, mas dinheiro. Estão desrespeitando uma premissa elementar da relação de consumo que é o aconselhamento ao crédito responsável.

O Nudecon abriu processo instrutório e notificou diversos bancos a prestar esclarecimentos sobre este meio de oferta de crédito. Segundo Larissa, o objetivo é firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) no qual eles se comprometam a retirar o destaque dado à opção oferta de crédito nos terminais de autoatendimento.

Para Lilian Salgado, advogada especialista em direito do consumidor e membro da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Minas Gerais (OAB-MG), os bancos se valem da necessidade e desinformação do consumidor para obter vantagem excessiva.

– Toda cobrança tem que ser informada no ato. Se o consumidor não foi informado, não tem a obrigação de pagar – avalia.

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) informou que desenvolveu, em abril, o normativo Contratação de Crédito por Meios Remotos, que estabelece procedimentos mínimos que assegurem confiança, qualidade, transparência e eficiência da contratação nesses meios.

Já o Banco Central ressaltou que a Resolução nº 3.694/2009 estabelece que a prestação de serviços por meios alternativos é admitida desde que preserve os direitos dos clientes, “devendo as instituições informá-los dos riscos existentes”. O regulador lembrou ainda a Resolução nº 3.517/ 2007, que determina a informação do Custo Efetivo Total (CET) da transação, que corresponde a encargos e despesas incidentes, antes da contratação.

BANCOS DIZEM PRESTAR TODAS AS INFORMAÇÕES

Segundo o Banco do Brasil, o cliente pode escolher os botões das transações que mais usa para compor a primeira tela do menu. O banco afirmou não ter registro de queixas sobre contratação de empréstimos por indução do menu.

O Bradesco argumentou que o posicionamento do botão e a cor diferente estão relacionados à agilidade em localizar o produto. E explicou que, após selecionar o crédito, o cliente é informado sobre o CET.

A Caixa disse que a oferta de empréstimo no caixa eletrônico é feita só para clientes pré-aprovados e que o procedimento requer aceite das condições, além de escolha do valor do crédito e da parcela.

O Santander informou que, antes da contratar o empréstimo nos terminais, o cliente é obrigado a percorrer diversas telas, nas quais são informados taxas, quantidade e valor das parcela etc.

Já o Itaú disse que para se efetivar a contratação, o processo exige “consentimento do cliente, que visualiza telas que explicam as condições e taxas do produto”. Consultado, o HSBC não respondeu.

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