Sharon Smyth e Charles Penty
Bloomberg
Liliana Proano Males não vai enfeitar sua casa em Madri para o Natal deste ano porque está prestes a perdê-la. Males e o marido, demitido do emprego durante a fase aguda da crise financeira, em 2009, não pode mais pagar as prestações do financiamento imobiliário. Com a taxa de desemprego da Espanha em 26%, o casal está entre os 350 mil proprietários de moradias que poderão ser despejados pelos bancos nos próximos dois anos, com o agravamento da crise imobiliária, segundo a Afes, uma associação da Madri que presta consultoria sobre reestruturação de dívidas.
Desde 2008 cerca de 150 mil famílias foram despejadas. “Fizemos um refinanciamento há três anos, mas agora estamos com a corda no pescoço”, diz Liliana Males, 42. “Não só estamos devendo mais que o empréstimo original, como também vamos perder a casa.”
Com o aumento da inadimplência dos financiamentos imobiliários, os bancos terão de provisionar dinheiro para cobrir perdas afetando seus lucros, diz Juan Villen, diretor de hipotecas do Idealista.com, site especializado em imóveis. Os bancos espanhóis absorveram 87 bilhões de euros (US$ 120 bilhões) em depreciações da carteira de empréstimos em 2012, depois que o ministro da Economia Luis de Guindos os forçou a registrar mais calotes em empréstimos a incorporadores imobiliários. O governo recorreu a uma ajuda de 41 bilhões de euros da União Europeia (UE) para amparar bancos deficitários.
“Os calotes nos financiamentos imobiliários tendem a aumentar porque são a última dívida que as pessoas deixam de pagar e o problema já está bem ruim”, diz Benjie Creelan-Sandford, analista do Macquarie Bank em Londres.
Mais de 5% dos financiamentos imobiliários residenciais na Espanha estavam inadimplentes no terceiro trimestre, em comparação a 3,5% no mesmo período de 2012, segundo dados do Banco da Espanha. O nível estava em 0,7% em 2007, um ano antes da implosão do mercado imobiliário. A AFES estima um aumento de 6% em 2014. Em relação aos empréstimos totais dos bancos espanhóis, os calotes bateram 13% em outubro em comparação a 12,7% no mês anterior.
A inadimplência está aumentando em parte por causa das mudanças exigidas pelo Banco da Espanha, que forçam os bancos a provisionar um volume maior contra financiamentos problemáticos. “Quando a bolha imobiliária estourou em 2008, os bancos usaram o refinanciamento em massa para cobrir financiamentos imobiliários residenciais vencidos e não pagos”, diz Carlos Baños, presidente da Afes. “O refinanciamento apenas exacerbou o problema.”
Os bancos refinanciaram hipotecas e concederam prazos de carência em troca da anexação de multas e gastos com cartórios ao principal dos empréstimos. Os bancos assumiram que a crise econômica duraria apenas uns dois anos e que os tomadores conseguiriam pagar, diz Baños.
Em abril, o Banco da Espanha ordenou aos bancos que revissem suas carteiras de empréstimos refinanciados, incluindo financiamentos imobiliários, para se certificarem de que estavam classificados de maneira uniforme. Os bancos tinham 208 bilhões de euros em empréstimos que haviam reestruturado ou refinanciado até 2012, segundo a autoridade reguladora.
A revisão fez o banco central concluir que a classificação correta dos empréstimos refinanciados causaria um aumento nas inadimplências de 21 bilhões de euros. Os bancos precisariam gerar mais ? 5 bilhões em provisões para cobrir perdas.
A taxa de inadimplência dos financiamentos imobiliários espanhóis do Santander aumentou de 3,1% em junho para 7% em setembro, depois que reclassificou os empréstimos que havia refinanciado. “Para um banco, essa é a área que exige mais atenção. Saber se se está registrando adequadamente seus empréstimos vencidos e não pagos, especialmente os refinanciados”, diz Alexander Pelteshki, analista da ING Financial Markets. “Há urgência por transparência.”
A recuperação da Espanha não tem sido forte o suficiente para impedir o aumento da inadimplência. A economia cresceu 0,1% no terceiro trimestre, em relação ao segundo – sua primeira expansão desde março de 2011, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas.
Mais de 4 milhões de pessoas perderam o emprego desde o começo do aperto do crédito. O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que o desemprego não cairá abaixo de 25% antes de 2018.
Como o custo dos empréstimos na Espanha atingiu em 2012 o maior nível desde a introdução do euro em 1999, o governo adotou medidas de redução do déficit, como congelamento de salários e aumento de impostos, que devoraram a renda disponível. A renda média anual das famílias espanholas caiu pelo quarto ano em 2012, para 23.123 euros, em comparação aos 25.556 euros de 2008, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas. Isso deixa 22% da população abaixo da linha de pobreza. Os preços das moradias na Espanha caíram em média 40% desde o pico de 2007.