Bastaram poucas horas do convite feito pelo Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região e dezenas de mensagens chegavam ao site relatando as agruras da rotina dos bancários. “Convocamos os trabalhadores a falar de sua rotina desgastante para que os representantes dos bancos conheçam a realidade da categoria”, explica a presidenta do Sindicato, Juvandia Moreira.
O espaço Boca no Trombone foi criado logo depois de encerrado o primeiro dia da rodada de negociação que tratou das questões de saúde e condições de trabalho. Frases como “Não acredito que as metas sejam causadoras de todos os males” ou “O setor bancário não está nem de longe entre os que mais têm problema de adoecimento” causaram revolta no Comando Nacional dos Bancários.
“Apresentamos dados de consultas, pesquisas científicas comprovando os problemas causados aos trabalhadores, e eles só fizeram questionar a metodologia”, relata a presidenta do Sindicato. “Negaram todas as reivindicações que buscam resolver a pressão que toma conta do ambiente de trabalho bancário e pode ter como consequência futura o adoecimento. As doenças mentais já são consideradas pelo INSS uma epidemia no setor bancário. Então convocamos a categoria a colocar a boca no trombone e denunciar. Os primeiros relatos confirmam o que informamos aos banqueiros: a forma como as metas estão sendo estabelecidas e cobradas estão acabando com a saúde dos bancários. Isso tem de acabar”, finaliza Juvandia.
Acompanhe alguns dos depoimentos enviados pelos trabalhadores.
“Quero deixar meu testemunho de que estamos sendo tratados como se fôssemos incompetentes. Os gestores também estão sendo muito pressionados e com isso fazem muitas ameaças… as reuniões diárias são desestimulantes e tomam tempo… também não tem mais funcionários para atendimento ao público, gerando muita insatisfação e reclamação por parte dos clientes.”
“Este fato ocorreu há alguns anos e foi um dos piores momentos que já passei ao longo da minha carreira. Gerenciava uma equipe que conquistou uma campanha de vendas regional… antes da entrega da premiação, o diretor começou a “soltar os cachorros” devido aos resultados financeiros aquém do esperado (gerais, do ano anterior)… a tragédia não acabou naquela noite… alguns acabaram se desligando da empresa, e outros se afastaram por depressão (inclusive eu por um longo período onde estive à beira do suicídio e que causou grande desestruturação na minha família e o fim de muitos sonhos). Espero ter contribuído para que os representantes da Fenaban saibam o que acontece na vida real de quem realmente “trabalha” em banco. E que o assédio moral infelizmente é uma realidade absurda no nosso cotidiano. O responsável por todo este desastre ainda é diretor regional na instituição. Será que humilhação e assédio moral é um problema de “gestão” como eles dizem ou será que os executivos são treinados para utilizar esta metodologia e alcançar lucros cada vez mais astronômicos?”
“É lógico que o abuso em cobrar metas e o próprio estresse diário dos bancários devido ao número reduzido de funcionários nas agências acarretam mais e mais doenças aos mesmos. Por exemplo, os caixas e atendentes. Trabalham sem parar por seis horas seguidas. É impossível não adoecer ou ficar com depressão. Se tivéssemos um número correto de funcionários nas agências e metas menos abusivas, certamente haveria muito menos afastamentos por doenças. Haveria mais funcionários satisfeitos e consequentemente melhor atendimento ao público.”
“Depois que o Santander, entrou parece que tudo piorou. As cobranças aumentaram, muitos colegas pediram para sair. Na agência onde trabalho eram oito funcionários e um estagiário, hoje somos seis e o estagiário vai sair. Como não ter problemas de saúde?”
“Tô no último de depressão e o nosso plano de Saúde Bradesco, nem pra pagar um psicólogo para nós. É só meta e mais metas.”
“Sou bancário há apenas dois anos, da CEF. Meu pai trabalhou por 30 anos no BB e sempre disse que o maior castigo seria se um filho dele virasse bancário. Não ouvi meu pai, achava que era exagero, mas vi que ele estava muito certo… sou o único funcionário do setor, não tenho função, faço duas horas extras por dia, mas mesmo assim, o volume de serviço só aumenta. Todos os setores são assim, agência pequena, poucos funcionários e o trabalho aumenta a cada dia. A cada dia me convenço mais que estudei muito para passar no concurso e não sou valorizado, só passo a existir quando a “meta” da agência é batida, daí vem o gerente dar aquele tapinha nas costas, mas quando não cumpro a meta o negócio é bem diferente. Será que um dia isso vai mudar?”
“O banco realmente não se interessa pela saúde de seus funcionários, no ano passado tive uma crise de estresse e precisei fazer um exame em uma sexta-feira… um gerente operacional não queria aceitar meu atestado dizendo que sexta-feira não é dia de ir ao médico, que funcionário tem de procurar médico que atenda no sábado.”
“Estou retornando de licença-médica de síndrome do pânico e depressão por assédio moral no banco e foi solicitado pelo meu médico que fizessem mudança de função… o banco se recusou. Falaram que eu iria passar por uma reciclagem até assumir uma carteira e que seria de forma gradativa… não foi o que aconteceu. Estou tendo que entregar meta e bater 200% para fechar a meta geral.”
“Banqueiro quer ver o bancário como na época da escravidão. Trabalho, produção, metas. Quando adoecer, substitui por novos. Onde está a cidadania, o humanismo, qualidade de vida do ser humano?”
“5º dia útil. 10h a agência abre. Sinto como se uma manada de búfalos invadisse o local, tamanho o barulho e a agitação. O primeiro cliente senta. Sua senha está bloqueada. Pela trigésima vez cancelo suas letras, afinal ele já esqueceu a que foi impressa há cinco dias. Próximo! Quer empréstimo. Ótimo! Atualizo o cadastro. Vou até a mesa do gerente para que ele confirme a atualização. Ali fico por uns 10 minutos, até que ele note a minha presença ou me dê a chance de falar o que preciso. Quando isso ocorre, ele atende meu pedido com olhar que significa: “Menina chata, de novo aqui pedindo coisas!” Volto ao cliente, mas seu empréstimo não é liberado, pois ele teve alguns atrasos no passado. Tento de tudo, mas sem sucesso… Próximo! Quer aumentar o limite do cartão. Faço o aumento. Vou até o gerente para deferir. Ele me diz: “O cliente comprou algum produto? Volte lá e ofereça uma Capitalização”. Volto e ofereço. O cliente não quer, mesmo diante de todos os meus argumentos. Volto ao gerente, peço novamente para ele deferir o aumento de limite do cartão. “Mas ele fez a Capitalização?” Com o olhar enfurecido e relutante, após quase 30 minutos consigo que o limite seja liberado. Assim segue o dia. Entre ofertas de produtos e negativas de clientes, entre cobrança de metas dos superiores e entre olhares penetrantes com um mix de ódio, estresse e cobrança. 16h. As portas se fecham. O gerente fala do resultado do dia e diz que precisamos fazer mais. Temos uma meta de 300 pacotes de tarifas e 50.000 de Capitalização para cumprir em três dias. Rio por dentro e me comprometo a fazer o meu melhor. Olho os caixas indo embora e volto à minha pilha de papel. Pendências acumuladas durante o dia que precisam ser resolvidas, independente de o ponto ter caído. Dia do pagamento. Olho meu holerite. Lágrimas escorrem!”
“Sou funcionário do BB e estou afastado desde novembro de 2003. Inicialmente com tendinites não reconhecidas como acidente de trabalho. Ao longo deste período desenvolvi além das tendinopatias crônicas, síndrome do túnel do carpo, pneumonia com sequela, problemas cardíacos com cinco procedimentos cirúrgicos e sem cura. Hoje só recebo pelo INSS por determinação judicial. Perdemos direitos como auxílio-alimentação e PLR no momento em que mais necessitamos e estamos vulneráveis. Desenvolvemos uma série de problemas de saúde pelas dificuldades financeiras que nós e nossas famílias passamos pela perda dos direitos. É preciso conquistar esses direitos.”
“O próprio banco faz questão de colocar um bancário contra o outro. Metas abusivas, competição desigual, relacionamentos promíscuos – onde não basta ser bom de trabalho para conseguir um bom cargo, mas sim contatos subalternos para melhorar seus crescimento – Quem não compartilha dessa idéia fica à margem do ambiente bancário. Tudo isso gera doenças da alma que explodem no corpo. Nessa hora, o banco e seus algozes são os primeiros a se isentarem da responsabilidade na saúde do funcionário.”
“Lamentável a posição destes representantes dos banqueiros que desconhecem o que acontece dentro de agências e departamentos. Até em momentos de negociação eles causam estresses desnecessários, fazendo pouco caso dos esforços dos bancários.”