Após complexa integração, Itaú Unibanco mira internacionalização

O Estado de S.Paulo
Patrícia Cançado

O banqueiro Roberto Setubal, presidente e acionista do Itaú-Unibanco, passou a frequentar o refeitório da empresa, onde comem todos os funcionários. Convencido por Pedro Moreira Salles, presidente do Conselho de Administração, ele e os outros principais executivos do banco perderam a vaga demarcada na garagem e as salas individuais.

Agora, Setubal, Salles e mais dez vice-presidentes dividem o mesmo salão. O Itaú, uma corporação conhecida pela disciplina e formalidade, também aboliu o uso de terno e gravata às sextas-feiras – e chamou até a consultora de moda Gloria Kalil para orientar os funcionários sobre a nova etiqueta corporativa. Essas e outras mudanças na rotina fazem parte do processo de integração cultural entre o Itaú e o Unibanco, que se fundiram em novembro de 2008.

“Antes da fusão, o Unibanco estava procurando ter mais processo, ser mais organizado. E a gente também vinha num trabalho de tentar criar um ambiente interno mais solto, mais flexível, menos estruturado.

Esse foi um aspecto muito discutido entre eu e o Pedro (Moreira Salles, um dos controladores do Unibanco) antes da fusão, o que evidentemente nos entusiasmava a fazer o negócio”, afirma Setubal. “Integrar culturalmente os bancos talvez seja a parte mais complicada. A minha vida mudou bastante, a forma de ver as coisas mudou. Quando você entra numa fusão deste tamanho, você tem de estar disposto a mudar.” O banqueiro agora participa de mais reuniões e precisa dar mais satisfação ao Conselho, que passou a ter mais influência em várias políticas do banco.

Ao final do processo, 30 mil funcionários terão mudado de lugar – cerca de 500 pessoas são remanejados a cada fim de semana. Até o fim de outubro, toda a rede de agências Unibanco deve migrar para o novo formato. Ao mesmo tempo, as agências do Itaú serão gradualmente reformadas, incorporando características do banco dos Moreira Salles. “Pegamos o melhor dos dois bancos para criar um novo banco.

É uma mudança brutal, que impacta todo mundo na organização, tanto pessoas do Unibanco quanto do Itaú”, afirma Zeca Rudge, vice-presidente executivo de marketing e relações institucionais do Itaú-Unibanco.

Com a integração em fase adiantada, o banco volta a mirar em internacionalização e parte de novo para a briga. Por causa da crise e da fusão, o banco perdeu participação de mercado, principalmente para os bancos públicos. Em dezembro de 2008, sua participação no total de empréstimos era de 21,7%. Um ano mais tarde, havia caído para 19,5%. “Estamos voltando mais agressivamente ao mercado. Acho que até tivemos um pouco de sorte, porque o período em que estivemos envolvidos com a fusão foi de baixo crescimento do negócio no Brasil”, acredita Setubal. “Ao longo do tempo, dá para recuperar o espaço perdido.”

“Bobeada”. Nas áreas onde já é forte, como financiamento de veículos e cartões, o Itaú quer manter sua participação. O banco também acredita no financiamento imobiliário, embora saiba que é complicado competir com a Caixa Econômica Federal nas linhas para a baixa renda. “O mercado está mais agressivo, mas o Itaú não vai abrir mão da rentabilidade para ganhar mercado de crédito. O Itaú continua sendo o mais rentável do mercado”, acredita Osmar Camilo, analista da corretora Socopa.

Uma das apostas do Itaú é o consignado, uma das modalidades de crédito que mais crescem no Brasil e é dominada por bancos médios. “Foi uma bobeada nossa, que a gente está correndo atrás. O consignado não estava na prateleira”, diz Geraldo Carbone, vice-presidente para as operações de pessoas físicas do Itaú-Unibanco. “Santander, Banco do Brasil e Bradesco foram para cima. O Itaú tinha o produto, mas não ofertava porque o crédito pessoal dava um retorno maior”, explica João Augusto Sales, analista da Lopes Filho.

Se da porta para dentro o Unibanco começou a influenciar o estilo de vida dos funcionários do Itaú, da porta para fora a visão é de que a cultura de fazer negócios do Itaú vai predominar. “Embora seja uma fusão, quem controla é a Itausa. A cultura que prevalece é do Itaú.

É mais conservadora em relação a riscos. No segundo trimestre, continuaram cautelosos, se voltando mais para tesouraria, que é a grande diferença deles em relação ao Bradesco”, afirma Sales. “Está havendo um predomínio do Itaú, mas é natural que seja assim”, acredita Wagner Salaverry, da corretora Geração Futuro.

Marca. Para os clientes, a herança do Unibanco será mais sutil. A começar pela marca, que desapareceu das fachadas. A decisão, aparentemente, não gerou nenhuma crise existencial. “Em nenhum momento pensamos em manter os dois nomes. Eram duas organizações fortes, mas incontestavelmente a marca do Itaú era a mais valiosa”, diz Fernando Chacon, diretor-executivo de marketing do Itaú-Unibanco. “As experiências que a gente observou de marca mista não foram necessariamente bem sucedidas. As que tiveram sucesso tinham atividades complementares, como o JP Morgan Chase – o JP Morgan era banco de atacado e o Chase, de varejo.”

Quem visita uma nova agência pela primeira vez nota um Itaú mais moderno e mais aconchegante (até onde um banco pode ser), com sofás de espera e sem as inconvenientes portas giratórias – uma das ideias vindas do Unibanco. Os sinais do banco dos Moreira Salles estão nos detalhes. O slogan 30 horas, por exemplo, foi incorporado aos caixas eletrônicos e à internet. O Uniclass continuou sendo um serviço de atendimento personalizado para correntistas de maior renda.

Nas pesquisas, o Unibanco aparecia como um banco mais próximo, que dá mais atenção ao cliente. O Itaú quer levar essa cultura para as agências. Além dos sofás de espera, o novo layout prevê um sistema de senhas, móveis mais leves, vidros bem mais baixos entre o cliente e o caixa e TVs de plasma atrás dos caixas (dá para acompanhar as últimas notícias enquanto se espera na fila).

“Talvez pelo fato de o Itaú ter buscado escala por muitos anos ou por ter priorizado eficiência, a gente tenha construído a imagem de um banco sólido, contemporâneo, mas deixado de lado um pouco da questão da proximidade”, admite Chacon. “A preocupação era deixar o espaço mais leve e pessoal. Tradicionalmente os bancos são meio sisudos. E o assunto segurança era muito ostensivo”, diz Carbone.

Para compensar a retirada da porta giratória, o banco está reforçando o sistema de vigilância por câmeras e introduzindo um cofre-forte, chumbado no chão a cada dois caixas, que faz toda a manipulação das cédulas. A ideia é que as caixa-registradoras só tenham troco.

A reformulação das agências foi feita com a consultoria de um escritório de design inglês e vai consumir investimentos da ordem de R$ 500 milhões. A previsão é que todo o trabalho esteja concluído em três anos. Essa é a maior mudança desde 1992.

Sinergias. Ao contrário do que ocorreu em outras fusões e aquisições, o banco pretende fechar apenas 15 das mil agências do Unibanco. “Não adianta pegar os clientes e empilhá-los numa agência só porque a qualidade do serviço cai. Estamos em um mercado em expansão, não faz sentido fechar ponto”, diz Carbone. “As sinergias não virão do fechamento de agências.”

Para não criar expectativas, o Itaú não responde a pergunta que não sai da cabeça de dez entre dez analistas: qual será o ganho com sinergias. “Não temos falado de números. Mas é muito visível o quanto nós temos evoluído em termos de despesa. Em termos de receita, foi um ano difícil, porque foi um ano de integração e nós não estamos focando no cliente como gostaríamos. Tem uma certa queima de energia interna”, diz Setubal. O banqueiro que o diga.

EM OBRAS

O que muda nas agências

1. A logomarca ficou com as bordas mais arredondadas, inspirada no iPhone. O objetivo era deixar a marca mais jovem e mais moderna.
2. Os caixas eletrônicos ganharam o slogan 30 horas, herdado do Unibanco, e uma nova inclinação. O cliente agora não fica de costas para a rua.
3. A porta giratória está sendo abolida das agências, a exemplo do que já ocorria no Unibanco. A segurança foi reforçada dentro da agência.
4. As agências terão sistema de senhas e sofás de espera. A intenção é levar o conceito de atendimento do Unibanco para toda a rede.
5. O serviço Uniclass, que no Unibanco era voltado para o atendimento de correntistas de maior renda, também foi incorporado ao Itaú.

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