STF julga na próxima quarta correção dos planos econômicos na poupança

Claudia Safatle e Juliano Basile
Valor Econômico | De Brasília

Assustados com o risco de receber uma conta de quase R$ 150 bilhões, os bancos buscaram ajuda no governo federal para sensibilizar os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) que, na próxima quarta-feira (27), julgam, finalmente, a correção das cadernetas de poupança nos planos Bresser (1987), Verão (1989), Collor 1 (1990) e Collor 2 (1991).

Os dirigentes das principais instituições financeiras foram ao Palácio do Planalto, ao Ministério da Fazenda, ao Banco Central e ao próprio Supremo. A fatura é gigantesca – corresponde a quase um terço do patrimônio do sistema bancário – e uma decisão favorável aos poupadores pode resultar numa interrupção do crédito no país.

Os bancos demoraram a acordar para o problema que tramita há mais de 20 anos. Só se atentaram para o risco quando, em 2007, houve uma corrida de poupadores ao judiciário. Naquele ano encerrava o prazo para as ações do Plano Bresser. Hoje são mais de 1 milhão de ações individuais e mais de 1 mil ações coletivas, todas em busca de correção mais generosa das cadernetas de poupança nas viradas dos planos de estabilização. Uma votação favorável do STF pode ter consequências devastadoras para o sistema em geral e para os bancos públicos, em particular.

Banco do Brasil e Caixa Econômica respondem por 52% dos depósitos em poupança no país.

Os julgamentos de ações individuais em todas as instâncias da Justiça ao longo desses anos foram integralmente a favor dos poupadores. Inclusive as ações que passaram pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo STF.

Os bancos foram provisionando e hoje tem em seus balanços algo como R$ 18 bilhões, cifra muito distante do que pode vir a ser cobrada.

Como só mais recentemente o setor financeiro acordou para a dimensão do problema, está difícil convencer os magistrados a mudar o entendimento que vinham aplicando até hoje. “Mas como só agora vocês aparecem para argumentar?”, perguntaram vários ministros a esses interlocutores dos bancos. O contencioso dos bancos, explicou um desses interlocutores, estava terceirizado e isso dificultou a tomada de consciência para o tamanho do problema.

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) pediu estudos minuciosos das empresas de consultoria LCA e Ernst & Young.

Ambas calcularam a rentabilidade dos bancos antes e depois de cada plano econômico e concluíram que não houve ganho do sistema com a fórmula de correção imposta pelo governo à época.

“Os bancos não ganharam nem os poupadores perderam”, alega a Febraban, com base nesses trabalhos que estão no cerne da argumentação. Ademais, cabia às instituições financeiras cumprir rigorosamente as leis e normativos dos planos de estabilização que determinavam como seria a correção no mês de implementação de cada plano.

O STF vai, agora, julgar seis ações e a partir delas será dada solução para um milhão de ações individuais, mais de mil ações coletivas em que poupadores pedem a correção de suas cadernetas nos planos e para todos os investidores que tinham poupança na época mesmo que não tenham recorrido à Justiça.

Em conversas reservadas com ministros do STF, vários advogados que atuam no caso verificaram que a tendência inicial é a de derrota das instituições financeiras.

De início, apenas os ministros Gilmar Mendes e José Antonio Dias Toffoli estariam propensos a votar a favor dos bancos. Eles são relatores de ações que vão ser julgadas na próxima quarta-feira sobre o assunto.

Já os ministros Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski, que é relator de uma Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) sobre o tema, tenderiam a votar a favor dos correntistas. Há três anos, Lewandowski negou um pedido de liminar feito pelos bancos para suspender os processos sobre o assunto no país num despacho em que lembrou os lucros das instituições financeiras.

Atrás do placar, os bancos esperam contar com os votos de Teori Zavascki, Carmen Lúcia Antunes Rocha e Rosa Weber, mas ainda não sabem se esses ministros vão julgar a favor da constitucionalidade dos planos.

O ministro Luís Roberto Barroso deve se declarar impedido de votar a questão por razão de foro íntimo. Como advogou num caso envolvendo planos econômicos antes de ingressar no tribunal, ele não participaria do julgamento.

O ministro Luiz Fux também pode se declarar impedido, pois a sua filha trabalha no escritório de Sergio Bermudes, advogado que defende os bancos. Mas ainda não está certo se Fux sairá do julgamento ou não.

Caso esses dois ministros não participem do julgamento, a situação dos bancos ficará ainda mais difícil, pois eles precisam de, no mínimo, seis votos para garantir a constitucionalidade dos planos econômicos.

O voto do ministro Joaquim Barbosa, presidente do STF, é considerado uma incógnita. O fato de ele ter pressionado Toffoli para liberar os processos de sua relatoria para a realização do julgamento está sendo visto como um fator negativo aos bancos. Por outro lado, Barbosa esteve reunido com o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, em março passado, e ouviu uma explicação técnica sobre o caso e as eventuais consequências à economia de uma decisão desfavorável. Barbosa e Tombini estudaram na Universidade de Brasília (UnB) e se conhecem e têm boa relação.

Os efeitos para a economia, que já não está em seus melhores momentos, no caso dos bancos sofrerem uma derrota, podem ser incalculáveis. De imediato, teriam menos recursos para dar crédito, perderiam capacidade de alavancagem, pagariam menos tributos à União e os prejuízos se espalhariam para todo o resto da economia, tanto do lado do capital quanto do lado do trabalho, na medida que poderia implicar em aumento do desemprego.

Como órgão regulador do sistema bancário, o Banco Central está preocupadíssimo.

O Supremo sempre foi a favor da constitucionalidade dos planos econômicos em vários outros aspectos, mas na questão da poupança as decisões tomadas até aqui em processos individuais, foram consideradas como um ponto fora da curva.

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