Parcelamento sem juros vira jogo de empurra entre bancos e lojistas

Roberta Scrivano e Ronaldo D’Ercole
O Globo

Sob pressão do governo para baixar as taxas do rotativo dos cartões de crédito, os dois maiores bancos privados do país começam as discussões com posições distintas sobre o que fazer com essa modalidade de financiamento bastante usada por lojistas para alavancar as vendas.

Enquanto o Bradesco diz ser contrário a qualquer tipo de ônus adicional aos lojistas que parcelam suas vendas no cartão, o Itaú Unibanco é favorável e admite cobrar dos comerciantes uma taxa para este tipo de operação. Apesar das divergências, a Federação do Comércio de São Paulo (Fecomércio-SP) informa que os lojistas de pequeno e médio porte já pagam entre 3% e 6% do valor das vendas que parcelam sem juros pelo cartão de crédito.

A ideia de alguns bancos privados de cobrar taxas extras de lojistas, ou reduzir o número de parcelas para financiamento no cartão de crédito foi mal recebida pelo governo, que vem trabalhando nos últimos meses para cortar os custos financeiros das empresas.

Banco quer dividir ônus com lojista

Representantes do governo, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal, além das operadoras de cartões, a Cielo e a Redecard, que são controladas por bancos, têm participado das discussões para reduzir o que é cobrado pelos cartões.

Todos, a princípio, com exceção do Itaú Unibanco, se dizem contrários a uma sobretaxa aos lojistas. Em favor dessa cobrança, o maior banco privado do país argumenta que, embora seja uma opção do lojista fazer o parcelamento sem juros, o risco da operação fica exclusivamente com o banco. Até aqui, esse risco vinha sendo coberto pelas altíssimas taxas cobradas no crédito rotativo. Com a queda dos juros, o Itaú Unibanco pondera que seria natural dividir o risco das operações com os lojistas.

O diretor do Bradesco, Marcelo Noronha, afirmou em conferência com jornalistas nesta semana que não há necessidade de “nenhuma contrapartida para reduzir o juro do rotativo, porque o banco ganhará mais com o aumento do volume de transações”.

Procurada, a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito (Abecs) informou por meio de sua assessoria que, por enquanto, a entidade não tem um posicionamento oficial sobre a questão.

Altamiro Carvalho, assessor econômico da Fecomércio-SP, se disse surpreso com essa discussão, uma vez que os lojistas já pagam (de 3% a 6%) para vender parcelado no cartão. Pior, lembra ele, esse custo adicional vai para o bolso do consumidor, uma vez que o lojista o embute como custo nos preços dos produtos.

– A mudança (uma taxa adicional) não interessa ao comerciante, nem ao consumidor. Só aos bancos e operadores de cartão, e se for adotada seria mais uma decisão unilateral – disse Carvalho.

O economista da Fecomércio-SP lembra ainda que os cartões, por não estarem sujeitos à fiscalização do Banco Central, são pouco transparentes nas taxas que praticam. E, como as taxas são decididas em cada negociação, as pequenas lojas, sem grande poder de barganha, pagam mais caro.

Parcelamento seria direito

Embora o tema ainda esteja no campo das discussões, a associação de defesa do consumidor ProTeste já se declarou “totalmente contra qualquer nova oneração”. Para Maria Inês Dolci, diretora da entidade, o parcelamento sem juro é um direito adquirido tanto do consumidor quanto do comerciante.

A Fundação Procon de São Paulo tem uma posição menos definida, e diz que, para haver alguma alteração, é preciso um debate maior entre os bancos e a sociedade.

– Este é o modelo brasileiro. Tanto o consumidor quanto o comerciante dependem deste parcelamento – disse Renan Ferraciolli, diretor do órgão.

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